A leviandade daqueles que têm o poder armado na área de segurança é estarrecedora.
Na capa do site de O Globo, o que o Ministro da Defesa, Raul Jungman disse ao RJ TV: Rocinha, à noite, estava “pacificada”.
Trata-se de algo impressionante: oito horas antes, era a guerra, o inferno na Terra, o caos.
“Pacificada”, seu Jungmann?
Devo cumprimentá-lo, então, porque superou de longe deu companheiro de Governo, Moreira Franco, que nos anos 80 engambelou muita gente prometendo acabar com a violência em seis meses.
O senhor fe-lo (horrível, não é? mas seu chefe gosta deste pernosticismo) em seis horas.
Espanta a visão espetacularizada que mídia e governos têm da questão da criminalidade e da violência.
É um palco, acendem-se as luzes, temos efeitos espetaculares, trilha sonora de tiros e rajadas, figurantes negros, sem camisas ou com elas enroladas à cabeça, homens fardados, blindados, fuzis, um frenesi que prende a a atenção, cativa os olhos, aperta os corações.
Logo depois, cessam os sons, apaga-se a luz e a selva continua ali, silenciosa e esquecida.
A Dona Lúcia, que só é Lúcia por ter de esconder o seu nome, dia, em matéria da Agência Estado:
“Aqui, tanto bandido quanto policial pega o nosso celular para ver o que tem. O bandido quer saber se tem vídeos com imagens deles. O policial quer ver se estamos ajudando traficante. Os vídeos que filmam da janela e espalham são aterrorizantes: olho arrancado, gente queimada viva, cabeça cortada, pernas espalhadas. São cruéis dos dois lados, estão ali para matar e morrer”.
“A vida ficou muito cara na Rocinha por causa do Rogério. O pessoal dele cobra R$ 90 pelo botijão de gás. Eles cobram taxa dos donos de supermercados, da água mineral. E passou a ter roubo, estupro, violência doméstica. A gente não pode reclamar com a polícia, até porque a UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) não existe, fica só na rua principal”.
É assim a “paz” da sombra, da penumbra onde atiramos os nossos pobres, a gente destinada a embrutecer, a ter filhos que serão figurantes, embuçados ou fardados, das próximas sessões do espetáculo pirotécnico.
Está fora do da cabeça desta gente firmar uma paz com emprego, com educação, com cuidados às crianças, com o fim da hipocrisia de uma classe média que fuma seu baseado mas não discute a liberação controlada da maconha que ela ou seus amigos e conhecidos fumam e alimenta o tráfico.
Mas se anima, rápido, com a “solução” com boas “blitzen” e com soldados portando fuzis pesados em meio ao formigueiro de gente, onde nem podem atirar em um sem trespassar dois ou três que estejam na linha de tiro.
Por enquanto, pois vai se avolumando a turba de loucos, que querem logo o canhoneio, as bombas, a instalação de “postos de fronteira” -“checkpoints”, na linguagem deles – para controlar o fluxo de porteiros, zeladores, empregadas domésticas, balconistas, caixas de supermercado se os quais o Leblon, Ipanema, São Conrado e Barra ficariam descuidados, sujos, precários.
A Rocinha está “pacificada”, diz o Jungmann. O Brasil está em ordem, as instituições funcionam.
Na sombra, na selva, na escuridão, segue a guerra de extermínio daqueles que só são vistos na hora do show.