Ouvimos todo o tempo que, para bloquear a transmissão da Covid-19 e minimizar os danos do novo coronavírus, precisamos de vacinação em massa da população.
Existem duas condicionantes para isso: termos vacinas em quantidade suficiente e termos a capacidade de aplicar estas vacinas em volume e velocidade acentuados.
Estamos mal nos dois aspectos.
Temos, somando Coronavac e vacinas da Índia, 10,1 milhão de doses. É o que teremos, salvo surpresas, até o final da 2a. quinzena de fevereiro, quando começa a aplicação da dose de reforço indispensável da vacina do Butantan, que representa 80% deste total, que talvez possa entregar algumas doses, uma vez que a Fiocruz já admite que nada receberá para processar antes de 8 de fevereiro.
Talvez seis ou sete milhões de pessoas, se contarmos com o fato de que aqueles que tomarem a vacina indiana possam esperar perto de três meses pelo reforço.
Isso representa 3% dos brasileiros, e 3% de vacinados tem efeito epidemiológico zero.
Diante da escassez, em lugar de estarmos procurando desesperadamente como aumentar o volume de vacinas disponíveis, estamos criando um escala abilolada de prioridades. Temos a Prioridade 1, a 1-A; a 1-B e assim, sem ironia, até a Prioridade 1-Z, na medida em que o Governo, de olho nos frutos políticos, vai agregando categorias profissionais ao primeiro grupo a vacinar.
O panorama internacional de disponibilidade de doses de vacina é sombrio.
Além do apetite que terão os EUA com o plano de Joe Biden de vacinar 100 milhões de pessoas em 100 dias, já há problemas de abastecimento na Europa, com reclamações e promessas de ações judiciais contra a Astrazêneca, na Itália e em outros países, pelo fato de a farmacêutica anglo-sueca estar reduzindo suas previsões de entrega.
Não haverá tão cedo o cenário imaginado por Eduardo Pazuello, de que em pouco tempo nos estarão batendo às portas para oferecer vacinas em profusão.
Nossa melhor esperança está em conjugar contratos de grande volume com vacinas fora do mainstream farmacêutico, como a SputnikV, combinada com lotes emergenciais das grandes mundiais, como a Pfeizer, Janssen e Moderna que, mesmo com pequenos quantidades e problemas logísticos, possam nos ajudar a formar um estoque de suprimento vacinal que permita chamar a população a vacinar-se.
Sim, porque é o povo na fila para tomar vacina que cria a pressão política para que a vacinação ande rápido, como o Brasil, por três décadas, sabe fazer andar.
E há ambiente para isso, como mostra a pesquisa do Datafolha que aponta nada menos de três quartos dos brasileiros querem vacinar-se.
Tanto quanto o negacionismo antivacina do presidente da República nos prejudicou, ajuda-nos (ou ajudar-nos-ia, se tivéssemos uma diplomacia) ter um povo ansioso, reivindicando a vacinação.
Esta é a bandeira a ser levantada, a da vacina já, porque se ela for exigida pela população até mesmo o governo de parvos que o Brasil tem terá se se mexer e o peso do nosso país em movimento é grande demais para que resistam e nos obriguem a ser apenas o destinatário das sobras, dos rebotalhos de vacina para os quais não tenham saída.
Obter vacinas é política, exigi-las também é.