A cada dia fica mais evidente que a história da compra, por grandes empresas, de nada menos que 33 milhões de doses – o triplo das que temos no país, hoje – era uma farsa desavergonhada. A manchete do Valor mostra que as empresas não querem ver seus nomes metidos nesta pantomima.
Mas foi estarrecedor ver, agora cedo, na Globonews, o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos, José Velloso, confirmar que a cúpula do empresariado brasileiro estaria mesmo negociando com um personagem misterioso – cuja identidade não pode ser revelada – a compra de três lotes de 11 milhões de doses da vacina Astrazêneca e que o vendedor deveria permanecer secreto para não sofrer o assédio da imprensa e a pressão de governos.
Hein? Vendedor de vacinas “incógnito”, feito -ou literalmente isso – traficante de drogas?
Aliás, diante da negativa peremptória do laboratório de que tenha vendido ou planeje vender doses para o setor privados, mas apenas para governos e instituições multilaterais (como a Covax-OMS), o que garante que a “trouxinha” de vacinas que está sendo oferecida é original e eficaz?
O pior é que uma vergonha como essa é apoiada pelo governo brasileiro e pelo próprio presidente da República, mesmo quando a Astrazêneca – a fonte de abastecimento deste atravessador de colarinho branco – não entrega a matéria prima para fazermos a vacina aqui e nem antecipa, em doses prontas, o imunizante que poderia evitar milhares de mortes.
Como cidadãos e como governo, o Brasil não pode dar apoio a uma suposta venda clandestina de vacinas, a não ser que, como fazem as milícias, ache legítimo cobrar – para quem pode pagar – cobrar ágio para comprar botijão de gás, como ocorre nas áreas “dominadas” do Rio de Janeiro.