Quando se analisa a tão deprimente quanto inevitável entrega de ministérios a partidos que nada tem a ver com as forças que elegeram o novo governo, costuma-se tratar isso como uma “perda necessária” para conseguir governar.
E, de fato, tem este sentido, sim. Mas não é o único, embora quase que só a isso a grande imprensa se agarre, apresentando a divulgação dos nomes como uma capitulação de Lula.
Raramente se leva em conta que é, também, o inverso: não se trata apenas de montar o governo e de fortalecer seus apoios, mas de desmontar a oposição e enfraquecer o seu poder.
Parece haver gente que se esqueceu que o bolsonarismo não apenas chegou perto de vencer as eleições quanto deixou como herança uma bancada de extrema direita que é maior que a da aliança de esquerda que saiu vitoriosa nas eleições para presidente.
Os três partidos contemplados – MDB, PSD e União Brasil – somam 150 votos na Câmara, o suficiente para fazer pender a balança para o governo ou contra ele. Acabamos de ver, na votação da PEC da Transição que, ruim com eles, pior (e muito) sem eles.
Os puristas e os que desanimam fácil com as dificuldades deveriam ter isso em mente: quem estará no governo é um homem que em meio século de vida sindical e política e em quase 600 dias de prisão não perdeu a sua essência.
E que não precisa, por isso, fazer as proclamações de purismo que é tão comum aos falsos.
As difíceis costuras finais do ministério Lula têm, em grande parte, este sentido e se parece que é apenas o contrário é que não vemos – até porque não é agradável – a parte da política real que exige que a virtude preste tributo ao vício.
É preciso, mesmo cedendo mais do que se havia inicialmente pensado, concluir a formação da base de que se depende para começar a governar, já no final de sexta-feira, quando deverão ser conhecidas as primeiras ações da nova administração, sobretudo na economia, o setor onde se terá de dar respostas e rumos com mais urgência ao país.