A tarde de hoje – e amanhã, porque dificilmente todas as decisões serão tomadas em uma única sessão – vai demonstrar se temos um Supremo Tribunal Federal digno deste nome ou se temos, como já tantas vezes sinais disso, uma corte que, como uma pasta, se anula e amolda a pressões políticas.
O primeiro caso é o da instalação da CPI da Covid-19. A decisão de Luís Roberto Barroso não tem nenhum malabarismo jurídico.
O parágrafo 3° do artigo 598 da Constituição não poderia ser mais claro (os grifossão meus): “As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores”.
É tão óbvia quanto não é inédita e já foi tomada em várias outras ocasiões.
Não cabe “modulação” em algo tão explicitamente definido. Suspender o seu funcionamento ou definirem-se regras para seu funcionamento durante o período de pandemia são (ou seriam) atribuições do presidente do Senado, em nada relacionadas à instalação da Comissão que tem as condições de existência jurídicas completadas e só a partir daí seria passível de regulação sobre seu funcionamento. Tentar incluir, para fazer uma “conta de chegar” com os interesses manifestos do governo Bolsonaro de que ela não exista é que seria, isto sim, uma intromissão do Judiciário no funcionamento do Legislativo, não fazê-lo cumprir a letra estrita da lei. Mais, da Constituição Federal.
O segundo caso é a confirmação (ou não) da decretação de incompetência da 13ª Vara Criminal de Curitiba – leia-se Sergio Moro – nos processos contra o ex-presidente Lula.
É, desde o início dos processos, uma posição sustentada pela defesa de Lula, sistematicamente negada e que, afinal, foi reconhecida por Edson Fachin, de forma marota, com a ressalva de que estava apenas seguindo as decisões tomadas na 2ª Turma, no justo tempo e hora para tentar impedir a consumação do julgamento da suspeição do ex-juiz da Lava Jato.
Mas não impediu que a Turma a que pertence reconhecesse, por 4 a 1, que se impunha a continuidade do julgamento e, por 3 a 2, a suspeição de Moro.
A diferença entre a imcompetência e a suspeição é gritante.
Se não se questiona a suspeição do juiz, o aproveitamento das peças do processo é mera economia processual, a ser confirmada em decisão do juiz com o qual vá parar, em correção de foro, a questão.
Mas quando é questionada – e, agora, reconhecida em decisão irrecorrível – a parcialidade do juiz é evidente que esta suspeição contamina todo o processo, desde o nascedouro, e que juiz algum pode, contra a decisão do Supremo, validar como perfeitos os atos jurídicos processuais, sob pena de dizer que é insuspeito o que a Suprema Corte diz ser suspeito, o que equivale a uma revogação de decisão do STF por um juiz de piso.
Alegar que a declaração de incompetência supera a de suspeição é o mesmo que abrir espaço para uma inversão de hierarquia jurisdicional: o juiz “Zezinho”, da vara a que se remetam os processos, diz que está tudo muito bem nos autos. Em tese, aliás, ele poderia até “convalidar a sentença” do juiz suspeitos e deixar para lá a manifestação da 2ª Turma, numa completa inversão das regras jurídicas.
É a isso que, com apoio ainda do que resta de “morismo” na mídia, que se está convidando o plenário do Supremo Tribunal Federal a fazer.
Daí, se prosperar este absurdo evidente, é que pode merecer a alcunha de “Ínfimo Tribunal Federal”.