Eu, você e quase todo mundo, na bolha de classe média onde vivemos, conhecemos – verdade que cada vez menos – gente boa que não votará, de jeito algum, em Jair Bolsonaro, mas que reluta em votar em Lula, por razões que variam do rescaldo de sete anos de campanha permanente de desqualificação até outras, de alta indagação, sobre posições do PT diferentes das que o partido assumia há 20 ou 30 anos.
Hoje, porém, Bruno Boghossian revela na Folha como esta bolha é pequena, como está separada do universo do povo brasileiro, sem embargo de , ainda assim, representar aqueles 2 ou 3 por cento que podem ser decisivos na liquidação, em 1° turno, da disputa eleitoral ou, ao contrário, expor o país a quatro semanas de um outubro e, talvez, nos dois meses entre o 2° turno e a posse presidencial, a uma aventura golpista para a qual, sejamos honestos, podem faltar as condições políticas (internas ou internas) mas não faltam a loucura, a ousadia e as armas para fazer-se.
Ele dá os números: se 82% dos pesquisados rejeitam um dos dois candidatos favoritos no primeiro turno, apenas 5% rejeitam ambos. Ou seja, só um em cada 2o brasileiros não querem o “nem Lula, nem Bolsonaro” que durante meses ocupou a mídia com o “nem-nem” da tal Terceira Via.
A cristalização do voto é evidente: dos que rejeitam Bolsonaro, 76% votam em Lula; dos que rejeitam Lula, 69% votam Bolsonaro. “Só 9% dos antibolsonaristas dizem que não votam em Lula de jeito nenhum. Algo parecido ocorre do outro lado: 15% dos que rejeitam Lula se recusam a votar em Bolsonaro”, informam os dados do Datafolha.
Em números absolutos, para entender-se melhor: só menos de um em cada dez pessoas que rejeitam Bolsonaro recusam-se a votar em Lula; só um em cada 7 dos que se dizem antilulistas não vota em Bolsonaro.
A polarização não é um discurso político, é um fato social e só quem quiser iludir-se na cegueira não é possível ver;
O sábio Aristóteles, quando formulou o seu princípio filosófico do “terceiro excluído’, o famoso Tertium non Datur talvez não tenha pensado em que ele pudesse se demonstrar com tal clareza no comportamento político das sociedades.
E de fato não o é, por conta da variedade do pensamento humano, mas aparece em situações extremas, quando se ameaça a ideia de democracia.
Não se está colocando, artificialmente, uma ideia de “voto útil”, pragmático, ao eleitor, mas um plebiscito entre a democracia e a preservação de nossos direitos de cidadão, ou a tirania.