Minha geração – que abençoada! – teve muitos monstros sagrados da poesia e da música a nos ajudarem a pensar.
Um havia, porém, que era pessoalmente muito pouco conhecido pelo rosto, mas tanto pelo que criou, Aldir Blanc foi o mais perto de Noel Rosa que o Rio criou como poeta popular.
Não cabe fazer a lista imensa de seus clássicos, desde o triste “Amigo é pra Essas Coisas” até o hino da Anistia, com o “O Bêbado e a Equilibrista”.
Mais uma vítima desta doença horrorosa, que nos rouba o ar e a esperança
Os sites e TVs, hoje, tocarão várias pérolas do carioca do Estácio, criado na Vila Isabel e depois abancado, até o fim de sua fértil vida na Rua dos Artistas, antes Aldeia Campista, hoje agregada à Tijuca.
Eu tomo a liberdade, porém, de escolher uma, do início dos anos 70, para mim um hino de valentia que o Aldir, com o seu eterno parceiro João Bosco e a voz sem igual da Elis, certamente nos daria nesta hora de sermos fortes.
7 respostas
Que linda lembrança! Hoje ficamos um pouco mais sozinhos, com o coração apertado. Nunca vi Aldir, mas sinto essa passagem como se fosse de um grande companheiro de aventuras adolescentes… e ele foi isso mesmo. Através da valiosa presença de sua poesia. Siga sua trajetória em paz, poeta! Obrigada, Brito.
Grande Aldir Blanc, um gênio ! Em várias áreas porque, antes de abraçar definitivamente a música, formou-se em medicina com especialização em psiquiatria. Felizmente optou por colocar no papel as belezas e as sombras da alma humana, como só os poetas sabem fazer.
Um cara como esse,não DEVIA MORRER.
Acompanhei as notícias sobre o estado dele, desde a internação, através de um grupo de zap. Estou sentida demais. Para mim o Aldir não apenas a voz e a letra de canções que amo. Ele tinha uma certa presença na minha vida. Eu tinha uma intimidade indiretamente criada com ele, a quem vi poucas vezes de perto. Uma delas num desfile do terceiro grupo, há mais de 10 anos, quando as escolas desfilavam nas terças de carnaval no sambódromo. Ele era o homenageado pela escola Lins Imperial. Nesse dia ele do, carro de som acenou e mandou beijos na direção do meu companheiro, que na noite do Rio, é apelidado de Aldir, dadas as semelhanças físicas. Aldir, sabia disso e se divertia… Aldir Blanc, presente!
Almirante Negro (Título original), O Mestre-Sala Dos Mares ( Título pós-censura )
As duas letras, a original e a censurada, na voz de Elis Regina
Letra original (censurada)
Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo marinheiro (feiticeiro)
A quem a história não esqueceu
Conhecido como Almirante (Navegante) Negro
Tinha a dignidade de um mestre-sala
E ao acenar pelo mar, na alegria das fragatas (regatas)
Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas
Jovens polacas e por batalhões de mulatas
Rubras cascatas jorravam das costas
dos negros pelas pontas das (santos entre cantos e) chibatas
Inundando o coração do pessoal do porão
Que a exemplo do marinheiro (feiticeiro) gritava – não! (então)
Glória aos piratas, às mulatas, às sereias
Glória à farofa, à cachaça, às baleias
Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história
Não esquecemos jamais
Salve o Almirante (Navegante) Negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais
Mas faz muito tempo…
https://youtu.be/g7N1zts8M98
https://youtu.be/7–djtYGqKw
Quisera ter metade da capacidade de um Aldir, como médico ou poeta, e me comprazeria em entender a alma humana em todos os seus desvãos e descaminhos. Me pavonearia diante das verdadeiramente mais belas, independente de suas estéticas, pois já saberia distingui-las perfeitamente entre as pré-fabricadas em linha industrial. Me arvoraria em intérprete de toda a gente pequena, doce e desvalida que anda por aí à procura de um deles. Mas o sol não brilha ao mesmo tempo em todos os lugares, e enquanto é claro em uns, a escuridão chega a outros. Vá em paz, velho companheiro de escolha e de crenças, este mundo já tava ficando apertado pra tal gigantismo. Passe a ocupar o único lugar em que cabias verdadeiramente por completo, a memória das gentes. Luz e saudades…
Fernando Brito, você compara Aldir a Noel, com justiça. E não sei se você reparou na coincidência: Aldir se foi exatos 83 anos após Noel, também num 4 de maio.