A saga dos “Tijolaços” – não os deste blog, mas os de Leonel Brizola – seria uma trajetória cheia de vazios não fosse um amigo persistente que nos deixou ontem.
O jornalista Ápio Gomes, de 79 anos, há 40 era meu companheiro nas atividades de imprensa do PDT. Em 1997, sem jamais deixá-la de lado, assumiu a missão de recolher, organizar e indexar os mais de 600 textos que o governador publicou, a partir de 19 de fevereiro de 1984 e durante duas décadas, até a sua morte. (aqui, um registro de como nasceram os Tijolaços)
Não pensem os mais jovens que fosse tarefa simples: grande parte era escrita à máquina, as laudas perdiam-se na composição gráfica e mesmo os impressos, nesta quantidade imensa, amarelavam-se em pastas infindáveis e sempre desfalcadas por alguém que”ia fazer uma xerox” e jamais devolvia o recorte.
Leitor atentíssimo, revisor implacável, destes que faz falta a quem escreve como vulcão, organizador metódico e, acima de tudo, sempre um amigo leal e preocupado, Ápio só “saiu”, como sempre, depois de terminar o trabalho.
Finalmente conseguiu que o PDT editasse sua teimosa faina, uma coleção de todos aquele textos – agora não mais instrumentos do confronto político diário, como então, mas documentos imprescindíveis a quantos pretendam olhar a História na qual o líder gaúcho e carioca jamais deixou de combater – da qual estão prontos os dois primeiros volumes, com mais dois em confecção. Tudo, claro, com indexação e imprescindíveis notas de rodapé, porque as referências, depois de tantos anos, apagam-se da memória.
Há alguns dias, com exemplares destes primeiros volumes (de 1984 a 1987 e de 1987 a 1991), Ápio mandou-me uma carta cheia de gratidões imerecidas e carinhos que nunca fazem mal à alma.
Dava conta ao amigo, agora distante, que tinha concluído o que chamava de “tarefa de vida”, a coleta do que julgava, com razão, ser uma fonte imprescindível de “elementos de pesquisa para se estudar, por exemplo, a função de “capitão de mato” da imprensa brasileira e seu Partido Único”.
No turbilhão dos acontecimentos e sem o Ápio com quem durante anos contei para organizar a bagunça – aliás um traço comum com Brizola, que me punha no plural majestático, na única realeza que admitíamos, a dos “reis do improviso” – não a respondi por escrito, como deveria e gostaria.
Vou fazê-lo da maneira mais indesejada, pessoalmente, com o último adeus a um amigo que sabia falar e fazer serenamente o catálogo das emoções do brizolismo.
E que se tornou, assim, com seu jeito sereno e bonachão, o grande guardião dos Tijolaços.