Cristina Serra e o “será que eles voltam?” dos militares

A valentia tardia do ministro Luiz Edson Fachin em protestar contra as pressões do alto comando militar sobre o STF no julgamento de um habeas corpus em favor do ex-presidência virou motivo de deboche do general Eduardo Villas Bôas, autor do tuíte-ameaça.

Não poderia ser de outra forma, claro, porque é verdade.

Mas o novo tuíte do general é como “dar uma banana” ao STF, que primeiro obedeceu e, anos depois, se faz de valente guardião da autonomia do Judiciário.

E, com isso, sem qualquer sinal de arrependimento ou mudança de atitude, coloca uma questão que a jornalista Cristina Serra, corajosamente, coloca em seu artigo de hoje:quando — e se — será possível mandar os militares de volta aos quartéis onde, vê-se agora, jamais se confirmaram em ficar, por ordem da Constituição.

Será possível mandar militares
de volta para os quartéis?

Cristina Serra, na Folha

O livro “General Villas Bôas – conversa com o comandante”, do professor da FGV Celso Castro, joga luz sobre a atuação dos militares no período mais turbulento da história recente do país, que vai do impeachment de Dilma Roussef à eleição de Jair Bolsonaro.

A revelação mais importante é sobre o famoso tuíte do comandante do Exército, em abril de 2018, com ameaças ao STF na véspera do julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula. Villas Bôas informa que o tuíte teve um “rascunho” e que foi “discutido minuciosamente” por generais do Alto Comando. Nas palavras do entrevistado: “Recebidas as sugestões, elaboramos o texto final, o que nos tomou todo o expediente, até por volta das 20h, momento em que liberei o CComSEx [centro de comunicação do Exército] para expedição.”

Sim, foi isso mesmo que você leu. Villas Bôas confessa que a tradição golpista segue firme e forte entre os fardados e que o topo da hierarquia do Exército tramou para afrontar a mais alta corte do Judiciário brasileiro. Qual o comando constitucional que autoriza militares a exercer tutela sobre o poder civil? Em nome de quem? Como se sabe, o Supremo rejeitou o HC de Lula, preso dias depois. E agora, STF?

Em meio a tortuosos raciocínios sobre geopolítica e um ego que transborda das páginas, Villas Bôas deixa claro que as Forças Armadas não engoliram a Comissão Nacional da Verdade (“foi uma facada nas costas”), dá versões duvidosas sobre alguns acontecimentos e faz comparações despropositadas. Uma delas: que a desintrusão de não indígenas da reserva Raposa Serra do Sol (RR) equivale aos “pogroms de Stalin” na extinta União Soviética.

De volta à política 30 anos depois do fim da ditadura, os militares ocupam milhares de cargos, acumulam salários, privilégios e benesses. De mãos dadas com Bolsonaro, também são responsáveis pela catástrofe que já custou a vida de 240 mil brasileiros, até agora. A grande dúvida é quando —e se— será possível mandá-los de volta para os quartéis.

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