A Procuradoria Geral da República, noticia o UOL, arquivou o trecho do acordo de delação premiada do doleiro Dario Messer em que ele fala dos pagamentos que mandaria fazer em favor do procurador Januário Paludo, integrante e “mentor” – o grupo dos procuradores no Whatsapp chamava-se “Filhos de Januário” – da Força Tarefa da Lava Jato.
Ok, ninguém quer massacrar um procurador com base numa simples acusação e acusação de um reconhecido criminoso e, portanto, nada alérgico à mentira e à burla da lei, embora o próprio Paludo seja um sujeito capaz, como revelou o The Intercept, de fazer afirmações levianas e abjetas sobre a morte de Marisa Letícia, por seu ódio visceral a Lula.
Mas a pergunta é óbvia: se Messer mente nesta acusação, porque não mentiria em outras?
Quando um acusado passa à condição de delator, sua unção no processo passa a ser, essencialmente, a de testemunha dos fatos e cria-se assim a obrigação de não mentir, algo ao qual o simples acusado não está obrigado. Para a testemunha vale o “jura dizer a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade” que conhecemos dos filmes.
Não faz nenhum sentido ser aceito e homologado um acordo de delação premiada onde o delator, em tese, diz a verdade algumas vezes e em outras, mente.
Porque, obviamente, isso dá um poder abusivo e arbitrário a quem, teoricamente, investiga (ou não) o que é delatado de decidir contra quem e em quê, seletivamente, a delação será usada.
Não é a primeira nem a mais notória destas situações: antes dela, Delcídio do Amaral e Antonio Palocci tiveram delações mambembes aceitas apenas porque elas tinham o potencial de atingir Lula, mesmo que isso fosse feito com abuso de autoridade e que, depois, elas viessem a provarem-se mentirosas.
A única prova que o episódio revela é a que estamos cansados de conhecer: o Ministério Público tornou-se uma corporação odiosa, ao permitir que para seus “membros privilegiados”, como aconteceu anteontem com a “anistia prescricional” dada a Deltan Dallagnol, a lei não seja para todos.