O divã do FHC

Todos sabem que o autoelogio dos pretensiosos é a resposta que, sozinhos, podem dar à falta de elogios alheios.

Fernando Henrique Cardoso não hesita em seguir este caminho, embora sua cultura livresca quase nos garanta que conheça o dito de D. Quixote a Sancho: “louvor em boca própria é vitupério”

O artigo que publica hoje no Estadão já entra, pelo título, no terreno do ridículo.

“Beijar a cruz”.

Ou seja, converter-se, como ele fez de corpo e mente – pois alma é algo do que os traidores de si mesmos têm de expurgar –  ao neoliberalismo, à supremacia do mercado, à mão invisível de um deus financeiro e argentário que a tudo governa e conduz.

Que é fato que muita gente da esquerda – como ele o foi, ou dizia que era – abjurou de suas ideias e entregou-se, docemente, ao papel de servidor daquele credo. No PT, inclusive.

Mas a intenção de FHC é apenas dizer que ele era o príncipe e os que vieram depois dele são apenas arremedos mal-ajambrados do que ele foi. “É que Narciso acha feio o que não é espelho”:

“Sem coragem para fazer auto­crítica, o petismo foi pouco a pouco assumindo o programa do PSDB e agora os críticos do mais variado espectro cobram deste o suposto fato de não ter propostas para o Brasil… Entre­tanto, a versão modernizadora do PT é “envergonhada”. Fa­zem mal feito, como quem não está gostando, o que o PSDB fez e faria bem feito, se estives­se no comando.”

Vejam a pretensão: não apenas fez um período desastroso para o país, estagnou a economia, entregou patrimônio e saiu do Governo pedindo aos candidatos que, por patriotismo, ficassem quietos diante de uma “última ajoelhada” pedindo perdão ao FMI, como ainda se acha um modelo que os outros não têm como não seguir, embora o façam de forma muito menos “genial” que a ele próprio.

O que FHC não vê – porque não quer ver e ver a si mesmo em sua pequenez – é que o PSDB não está no comando pelo fato de que o povo tirou o PSDB de lá e por duas – duas, por enquanto – não permitiu que voltasse.

E fez isso não porque seja burro, ou que, como disse ele mesmo, precise que a tucanada seja mais carinhosa.

Fez porque abomina o projeto tucano de desmonte do país, de arrocho dos salários e expansão dos juros, de entrega das riquezas e da submissão do Brasil e de seu saque, em troca de miçangas e bugigangas da “modernidade”.

Porque nem nisso, no seu período, fez-se qualquer coisa para dar  ao Brasil autonomia tecnológica.

Fernando Henrique pode até ter razão em dizer que “beija-se a cruz” – seria melhor dizer “beija-se o látego” – em muitas situações econômicas. Não apenas porque há leis e contratos deixados por ele que, mesmo ruinosos, são respeitados em nome de não haver quebra da institucionalidade como, sobretudo, porque o seu pensamento colonizado sobrevive, forte, na mídia e em boa parte da elite brasileira.

Que mesmo percebendo que vive melhor num país que cresce economicamente não consegue conviver com a ideia de que os pobres podem e devem ascender à cidadania.

Mas o cúmulo da cara-de-pau fernandiana vem no trecho em que ele fala do pré-sal. Diz que houve  “a súbita sacralização do pré-sal” e reclama do seu controle exclusivo pela Petrobras.

Ele, sob cuja batuta se revogou o monopólio do petróleo que seu pai e seu tio, militares nacionalistas, ajudaram a erguer, que colocou a Petrobras sob a vergonha de ver afundar uma plataforma, deve trincar os dentes de ódio ao ver que a empresa sobreviveu, mesmo depenada pelas ações que ele mercadejou em Nova York e se levanta como uma das maiores gigantes do mundo do petróleo.

Uma empresa que, 15 anos depois do gesto entreguista de FHC e de dez leilões de concessão de áreas petrolíferas, continua sendo responsável por 92% de todo o petróleo que se produz aqui. Que descobriu o pré-sal e é a única com capacidade tecnológica de coloca-lo imediatamente, que ressuscitou a industria naval brasileira, que está formando dezenas de milhares de trabalhadores qualificados para o setor de petróleo e gás, é dessa empresa que ele fala ser incapaz de cuidar do maior tesouro descoberto neste país, em toda a sua história?

Ah, mas o petróleo vai baixar de preço, as energias alternativas vão tomar conta do mundo, é preciso tirar tudo de lá, rápido, não importa como e por quem.

Fernando Henrique hoje, tem um único serviço a prestar ao Brasil. É estar ao lado daqueles que representam a tentativa de retorno destas ideias entreguistas, para que o povo brasileiro possa ver bem, sem ilusões, quem são e o que são.

De resto, ele só faz lembrar o cidadão que apareceu no consultório do “Analista de Bagé” , ótimo personagem de Luís Fernando Verissimo, dizendo que era assim e assado e aformando que tinha, por tantos defeitos, complexo de inferioridade. E levou um passa-fora do analista, que disse que ele era um poço de vaidade e megalômano. “Mas por que”, disse o homem, “se eu tenho tanto complexo de inferioridade?” E o analista: “olha, piá, tu é muito vaidoso. Eu conheço gente muito mais inferior que tu e que não fica se gabando disso”.

 

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13 respostas

  1. Nunca votei em fhc. Entretanto quando chegou a presidência achei, na minha santa inocência, que uma coisa não poderíamos acusá-lo: incompetência. Enganei-me redondamente. os números mostram que além da conhecida soberba o sociólogo era não era apenas traidor mas incompetente: A taxa de desemprego trazida do ciclo de presidência do PSDB era da ordem de 13%, em maio de 2003;oito anos de Lula e dois de Dilma reduziram esse legado para 5,8% (maio;IBGE); em SP, especificamente, o desemprego era da ordem de 14% em fevereiro de 2003; recuou para 6,5% agora; a proporção de trabalhadores com carteira assinada saltou de 45,5% para 53,5 entre final do ciclo tucano e junho último; durante oito anos de governo de FHC o salário mínimo teve uma correção de 29,9%; no ciclo Lula/Dilma o reajuste acumulado é de 63,3%; em junho de 2003 a proporção do crédito na economia era de 24;6% do PIB; agora equivale a 50,6% dele; a dívida líquida do setor público passava de 60% em 2002; em junho deste ano caiu para 35%; a taxa de juro real, acima da inflação, era de 14% ao final do governo FHC; hoje é de 1,7%; em 2003, 28,3% dos brasileiros viviam na pobreza; hoje são 10,9%; 40 milhões de pessoas mantidas na soleira da porta, do lado de fora do país, foram incorporadas à cidadania. Os números não mentem. A classe media que é tucano deve entender que a direita defende os interesses dos 1% em detrimento dos interesses dos 99%. A classe média faz parte dos 99%. É simples assim.

  2. PSDB contra energia elétrica barata para o povo.
    PSDB contra redução da taxa de juros.
    O esforço do governo federal para reduzir as tarifas de energia elétrica em pelo menos 20% esbarra na intransigência dos governos tucanos de São Paulo (Geraldo Alckmin), Paraná (Beto Richa) e Minas Gerais (do PSDB de Aécio Neves), que não aceitaram negociar a renovação das concessões da Cemig, Cesp e Copel.

    PSDB é contra o Brasil.

  3. Esse muquirana, que um dia chegou a presidência e só governou para os mais ricos, se acha no direito de palpitar ou pautar o governo atual…sai fora FHC!

  4. A chamada aqui de cultura livresca de fhc é muito suspeita. É sabido que se reunia em grupo para ler O Capital com fim de entender. Sozinho não o conseguiria. Ademais estamos vendo que cultura livresca deixa a desejar em muitos escalões, como demonstrado pelos ilustres ministros do STF na interpretação de teoria de dominio do fato em que deram vexame internacional, frente inclusive ao formulador da mesma. O fato de possuir livros ou até ler não necessariamente dota o leitor do entendimento – há mentes cuja formação distorce qualquer ensinamento – e vejo esse como típico caso a ser apreciado.

  5. Fico intrigado com a capacidade de “se acharem os bons” que têm o FHC e o Delfim Neto, criticando a todos os governantes esquecendo o quanto foram nocivos ao país. Fora! Fora!

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