O funil

A semana começa com dois candidatos a menos na disputa eleitoral, com a desistência de Luciano Bivar, o candidato-fantasma da União Brasil, e a provável desistência de André Janones, em favor de Lula, que todos dão como certa após o encontro entre ambos, marcado para quinta-feira.

Embora, matematicamente, seja favorável a Lula a redução do número de candidatos, é na disputa política que se verá a diferença do “funil” eleitoral que ainda não acabou de estreitar-se.

Não adianta complicar as teorias ou fazer faca de ponta da linguagem nas entrevistas (nos debates e reuniões já vai ficando arriscado, por conta das reações do público). O bom senso, dizia o velho Descartes, o bom senso é a coisa mais bem distribuída, embora na política e em candidaturas possam chamar assim o que é simplesmente um erro.

E erros não faltaram na fracassada construção de uma candidatura conservadora que, embora incapaz de vencer a de Lula num primeiro turno pudesse se valer o espólio do bolsonarismo derrotado para enfrentá-lo no turno decisivo, agora já ameaçado de não existir.

O maior deles foi o de ter escolhido Lula como seu adversário preferencial, justamente pelo medo de perder o eleitorado de direita que ele, espertamente, sempre fez questão de preservar, mesmo quando passou por seus piores períodos de popularidade, quando desceu a perto de 30% das intenções de voto. Bolsonaro jamais deixou de emular seus núcleos mais radicais, sem medo de perder outros, porque ele sabe que não se vota Bolsonaro por Bolsonaro, mas para evitar que Lula volte ao governo.

Disse que era o maior, mas não disse que era o primeiro, porque o erro inicial foi o da eleição de 2018, quando se deixaram marcar pela aposta em um extremista desequilibrado e, não obstante, um especialista em despertar maniqueísmos como é Bolsonaro. Do Bolsodória a Paris, se deixaram marcar com tinta indelével.

Continuaram errando mesmo quando desembarcaram (ou foram desembarcados) do governo, mantendo o discurso anti-Lula, sob a capa da crítica a uma “polarização” que pretendia igualá-lo a Bolsonaro, o que qualquer pessoa com um mínimo de lucidez sabe ser falso.

Mas, ao contrário, fizram sempre questão de arrogar-se uma “superioridade” e uma suposta “capacidade de diálogo” que nunca funcionou entre eles e que recusou sempre a conversa com os líderes das pesquisas.

Foram todos caindo como peças de dominó: Huck, Mandetta, Moro, Doria, Eduardo Leite, Alessandro Vieira, Rodrigo Pacheco. Bivar foi mais um e, de todos, só Simonte Tebet ficou com uma “herança” que, pelas pesquisas, é nada.

Janones, que nunca foi levado a sério pelo establishment é o único que ensaia sair da disputa politicamente maior, porque saiu do fim da fila para tornar-se interlocutor do favorito, o ex-presidente.

Ciro, ao contrário, mostra-se obsessivo e corre o risco de perder até sua base eleitoral no Ceará, onde bateu pé em criar uma forma de romper uma aliança de esquerda de 16 anos, em buca de um palanque único reduzido pela ausência de Camilo Santana, que tem um peso eleitoral indiscutível: aparece nas pesquisas ao Senado com dois terços do voto dos cearenses.

O eleitorado de Ciro tem menos da metade da decisão de voto solidificada e, como mostram as pesquisas, uma tendência majoritária de migração para Lula. Sem ser novidade, suas perspectivas de crescer são mínima, mas as de minguar, grandes, à medida em que se aproximar a decisão.

O funil eleitoral vai se estreitando e deixando evidente que não há nada que possa ser mais importante que o sim à democracia e o não ao autoritarismo que Jair Bolsonaro significa.

A verdade é a realidade e ela vai se impor. Se as duas candidaturas “não 1%” vão permanecer – o que é provável mas depende de quanto seus apoios já reticentes sobrevivam – é menos importante do que o fato real de que boa parte seus eleitores não permanecerão.

Afinal, o bom senso é muito bem repartido…

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