A luta contra a ditadura não terminou. A criação das Comissões da Verdade, nacional e estaduais, é uma forma de continuar lutando contra o totalitarismo, que se alimenta de segredo e violência. Neste sábado, a imprensa noticiou, visivelmente assustada, que o julgamento da Anistia pode ser revisto. Há fatos novos: o principal deles é um parecer do novo Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, mudando o entendimento de seus dois antecessores, Roberto Gurgel e Antonio Fernando de Souza.
O Ministério Público Federal se manifestou favoravelmente a um pedido de extradição da Argentina, no caso de um policial argentino procurado em seu país por crimes de lesa-humanidade, argumentando que “a pretensão punitiva não está prescrita nem na Argentina nem no Brasil”.
A mudança se soma à condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos, em dezembro de 2010, pelo assassinato de 70 guerrilheiros do Araguaia, entre 1972 e 1974.
Há também um outro elemento, ignorado pela grande imprensa: a entrevista com Erimá Pinheiro Moreira, então Major do Exército, esclarecendo em detalhes os motivos que levaram o general Kruel, que era amigo do Presidente João Goulart, mudar de posição em menos de 12h. Moreira informou que Kruel recebeu seis malas cheias de dólares.
A OAB, inimiga histórica da Lei da Anistia, se animou com o novo cenário e declarou que vai protocolar no Supremo Tribunal Federal (STF) uma nova ação questionando a lei.
“A ação será formalizada no próximo dia 11”, afirmou o presidente da entidade, Marcos Vinicius Furtado Coelho.
E aí temos uma situação muito irônica. Ficamos sabendo que o julgamento da anistia, em verdade, ainda não terminou. Ainda faltam julgar os embargos de declaração.
Ou seja, um daqueles instrumentos jurídicos, que setores sociais e midiáticos acusaram – no processo do mensalão – de serem firulas protelatórias inúteis, podem servir para mudar, literalmente, a História brasileira. E mudar para melhor.
A revisão da Lei da Anistia, neste momento, teria um impacto muito mais simbólico (e por isso mesmo mais poderoso e duradouro), do que real, visto que existem poucos elementos ainda vivos que podem ser condenados, e já tão idosos que seria beneficiados automaticamente pela Justiça.
A anulação da Lei da Anistia significaria a derrota definitiva da ditadura, e abriria caminho, finalmente, para se ensinar nas escolas, civis e militares, o que realmente aconteceu: uma aliança espúria entre setores da elite e da mídia sem compromisso com o Brasil, e corrompidas por dólares americanos.
A “voz das ruas”, a verdadeira, não aquela que passa na TV, seria contemplada com essa anulação, visto que um dos principais gritos entoados pelos jovens era “a verdade é dura, a Globo apoiou a ditadura”. Por que os jovens gritavam isso, se não eram sequer nascidos no ano do golpe? Porque exigem uma condenação política de grupos de mídia que venderam a nossa democracia por dinheiro e poder. Não por outra razão, a Globo veio pedir desculpas. Só que não valem desculpas para um caso tão grave. As comissões da Verdade estão devendo isso ao povo brasileiro: convocar os senhores da mídia para darem esclarecimentos à sociedade sobre os motivos reais que os levaram não apenas a darem “apoio editorial” ao golpe e ao regime militar, mas a participar, nos anos anteriores, da campanha para minar a democracia brasileira. Uma campanha que, às vezes, nos parece que eles nunca interromperam.