“O muro é a ditadura”. Por Eleonora de Lucena

Eleonora de Lucena, durante dez anos (2000/2010) editora-executiva da Folha de S. Paulo, publica hoje no jornal paulista um artigo que orgulha o jornalismo e desanca os covardes o os oportunistas, na imprensa, na política e no empresariado.

“O muro é do candidato da ditadura, da opressão, da violência, da destruição, do nojo”, resume assim a imperdoável atitude dos que acham que críticas, ainda que várias delas justas, a um partido possam justificar quem assiste omisso o risco da morte da democracia, da liberdade e do convívio civilizado.

Compartilho pela grandeza do texto, compartilho pelo que resta de dignidade de uma profissão que me chamou, ainda jovem, pelo que podia fazer pela liberdade.

Não adianta pedir desculpas daqui a 50 anos

Eleonora de Lucena, na Folha

Ninguém poderá dizer que não sabia. É ditadura, é tortura, é eliminação física de qualquer oposição, é entrega do país, é domínio estrangeiro, é reino do grande capital, é esmagamento do povo. É censura, é fim de direitos, é licença para sair matando.

As palavras são ditas de forma crua, sem tergiversação –com brutalidade, com boçalidade, com uma agressividade do tempo das cavernas. Não há um mísero traço de civilidade. É tacape, é esgoto, é fuzil.

Para o candidato-nojo, é preciso extinguir qualquer legado do iluminismo, da Revolução Francesa, da abolição da escravatura, da Constituição de 1988.

Envolta em ódios e mentiras, a eleição encontra o país à beira do abismo. Estratégico para o poder dos Estados Unidos, o Brasil está sendo golpeado. As primeiras evidências apareceram com a descoberta do pré-sal e a espionagem escancarada dos EUA. Veio a Quarta Frota, 2013. O impeachment, o processo contra Lula e sua prisão são fases do mesmo processo demolidor das instituições nacionais.

Agora que removeram das urnas a maior liderança popular da história do país, emporcalham o processo democrático com ameaças, violências, assassinatos, lixo internético. Estratégias já usadas à larga em outros países. O objetivo é fraturar a sociedade, criar fantasmas, espalhar medo, criar caos, abrir espaço para uma ditadura subserviente aos mercados pirados, às forças antipovo, antinação, anticivilização.

O momento dramático não permite omissão, neutralidade. O muro é do candidato da ditadura, da opressão, da violência, da destruição, do nojo.

É urgente que todos os democratas estejam na trincheira contra Jair Bolsonaro. Todos. No passado, o país conseguiu fazer o comício das Diretas. Precisamos de um novo comício das Diretas.

O antipetismo não pode servir de biombo para mergulhar o país nas trevas.

Por isso, vejo com assombro intelectuais e empresários se aliarem à extrema direita, ao que há de mais abjeto. Perderam a razão? Pensam que a vida seguirá da mesma forma no dia 29 de outubro caso o pior aconteça? Esperam estar livres da onda destrutiva que tomará conta do país? Imaginam que essa vaga será contida pelas ditas instituições –que estão esfarrapadas?

Os arrivistas do mercado financeiro festejam uma futura orgia com os fundos públicos. Para eles, pouco importam o país e seu povo. Têm a ilusão de que seus lucros estarão assegurados com Bolsonaro. Eles e ele são a verdadeira escória de nossos dias.

A eles se submete a mídia brasileira, infelizmente. Aturdida pelo terremoto que os grandes cartéis norte-americanos promovem no seu mercado, embarcou numa cruzada antibrasileira e antipopular. Perdeu mercado, credibilidade, relevância. Neste momento, acovardada, alega isenção para esconder seu apoio envergonhado ao terror que se avizinha.

Este jornal escreveu história na campanha das Diretas. Depois, colocou-se claramente contra os descalabros de Collor. Agora, titubeia –para dizer o mínimo. A defesa da democracia, dos direitos humanos, da liberdade está no cerne do jornalismo.

Não adianta pedir desculpas 50 anos depois.

Fernando Brito:

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  • De onde pouco se espera, menos ainda sai.
    Eu jurava que a Falha de São Paulo destacaria na capa, talvez até com um editorial, as ameaças contra jornalistas da empresa. Nada! A Falha enfiou o rabo entre as pernas. Os donos daquele panfleto de direita devem estar se borrando de medo das ameaças do Bolsolão. Ou são cúmplices, mesmo. Só fazem um joguinho de cena de vez em quando para aparentar isenção e espírito democrático.

  • A FSP não titubeia; ela, os veículos do Grupo Folha, dentre eles o UOL, um dos maiores portais da internet brasileira no quesito conteúdo noticioso, em parceria com o Grupo Globo e outros do oligopólio midiático formaram o pavoroso Instituto Milenium, no ano de 2010, fazendo com que TODOS os grandes veículos de mídia brasileira (impressos e eletrônicos) passassem a atuar de forma coordenada, concertada, como partido de oposição política aos governos do PT; isso está registrado em fala pública de Judith Brito, que naquele ano presidia a ANJ. Antes disso, nos idos de 2005, foi a FSP o jornal que se prestou ao imundo serviço de ser porta-voz do canalha Roberto Jefferson; nem mesmo O Globo e veículos Globo ou de outro grande grupo de comunicação aceitaram aquela patranha, que foi a semente do enfraquecimento do PT, criminalizando as maiores lideranças do partido, visando não só desestabilizar, mas derrubar o governo do então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A farsa/fraude, acolhida e magnificada pela FSP, por meio de Renata lo Prete, recebeu o nome dado pelo criminoso Roberto Jefferson, corrupto de 4 costados pego com a boca na botija, mas que foi alçado à condição de herói; SEMPRE considerei o chamado "mensalão do PT" uma farsa, uma fraude, uma tentativa de golpe de Estado, para derrubar o governo Lula, criminalizar os líderes do PT, o partido, facilitando assim a volta da direita ao poder.

    São de conhecimento público público a inveja e o ódio nutridos por Otávio Frias Filho, editor-proprietário da FSP falecido este ano, em relação ao Ex-Presidente Lula. Os diretores do Grupo Abril, a partir da mesma época, passaram a fazer o chamado jornalismo de esgoto contra o PT e contra os petistas, em decorrência de não terem conseguido fechar contratos publicitários ainda mais milionários com o GF, mas principalmente por não conseguir firmar contratado de fornecimento de material para-didático para o MEC, o que alavancaria o faturamento e os lucros do grupo de comunicação então chefiado por Roberto Civita.

    Não bastassem os fatos acima relatados, TODOS os veículos da chamada grande mídia deram espaço, cevaram o ex-capitão do exército - que na ativa ameaçou explodir quartéis e a adutora da CEDAE que abastece o Rio de Janeiro, chegou a sofrer processo e condenação disciplinar, ficando 15 dias preso no quartel, tendo sido feito depois um acordo, no STM, para inocentá-lo, desde que ele se desligasse da FFAA, passando à reserva - durante 31 anos, pois as primeiras insubordinações e verborragias de Jair Bolsonaro remontam o ano de 1987. Desde então, JB entrou para a política, primeiro como vereador, depois como deputado federal, por 7 mandatos, o último dos quais se encerra em dezembro próximo. Nessa três décadas, JB foi destaque nas páginas de jornais e revistas, nas emissoras de rádio e televisão , depois nos portais noticiosos da internet e em vários blogs. Embora os veículos de mídia sempre soubessem o que JB era e representava, já que se portara como mau militar, insubordinado e formador de motins, arquitetando atos terroristas, documentados e publicados em revista, ele foi tratado de forma benevolente, folclórica; o histrionismo de JB, os absurdos que falava, as declarações criminosas, como aquela em que ele afirmou que a ditadura militar empresarial-militar deveria "ter matado uns 30 mil, inclusive FHC", na época presidente da república, tudo isso foi relevado e considerado apenas fanfarronice de um boquirroto. Com inexpressiva atuação parlamentar, JB ganhou destaque no noticiário pelas ofensas, difamações, calúnias e ameças que fazia aos adversários, pela apologia aos crimes e criminosos de Estado e pelos crimes diversos que cometeu, abusando da condição de deputado federal. O sistema judiciário brasileiro (MP, polícias e poder judiciário em si) sempre passaram a mão na cabeça de JB, que mesmo tendo cometido inúmeros crimes na carreira parlamentar, não teve as denúncias aceitas pelo STF, não foi julgado nem condenado por essas práticas.

    Enfim: o monstro que hoje Eleonora Lucena abomina e denuncia com propriedade foi cuidadosamente cevado pelo PIG/PPV , pelo sistema judiciário brasileiro e pelas oligarquias da política e empresariais; além disso, JB sempre cultivou a simpatia da baixa oficialidade do Exército e depois fez parcerias, para conquistar também as PMs e milícias delas derivadas. Depois disso, JB, que tem o filho Eduardo como escrivão da PF, conquistou também essa polícia política. Embora integrantes, afeitos ou simpáticos mais ao PSDB e a uma direita privatista e entreguista, mas travestida de social-democracia (que é o tucanato), ministério público e poder judiciário JAMAIS investiram contra JB, mesmo sendo os abusos, ilegalidades e crimes por ele cometidos praticados em ambiente público. Portanto TODO esse aparato midiático de estatal, seja por omissão ou por ação, são responsáveis pela ascensão de JB e todo o mal que ele representa. O muro em que os covardes estão encimados, típico dos tucanos, que sempre se mostraram escorregadios em decidir qualquer coisa, representa apoio. Basta ver a postura de FHC, exemplo maior de covardia, oportunismo e falsidade, tanto no aspecto político, quanto no magistério e na produção livresca. As centenas ou milhares de muristas que se omitem ou tergiversam em relação ao risco que representa a eleição de JB como presidente da república mostra quão vis, canalhas, desprezíveis são as classes média, média-alta e alta, além das castas que sempre detiveram o poder real nesse país que amargou mais de três séculos de escravidão. Eleonora Lucena omitiu o papel nefasto da ORCRIM Fraude a Jato, que além de destruir o Estado social brasileiro, permitindo o desmonte e entreguismo, atendendo aos interesse econômicos e geopolíticos dos EEUU, desestruturou o tecido social, disseminou e inculcou o ódio entre os brasileiros, sobretudo em relação ao PT - criminalizado como toda a política e administração pública - à Esquerda e a todos aqueles que defendem o papel social do Estado, os direitos humanos, a distribuição de renda, a não discriminação das minorias, os direitos humanos.

    Esse artigo de Eleonora Lucena é esclarecedor, necessário, mas insuficiente, já que vem publicado muito tardiamente, quando a vitória de JB já foi acertada pelos golpistas que organizam , fiscalizam e realizam essas eleições farsescas e fraudulentas.

    • Excelente.

      Resumiu muito bem o que ocorreu e tem a mesma conclusão que eu.
      O TSE não permitirá a vitória do Haddad de jeito nenhum.
      Não hesitarão um segundo em fraudar a apuração. O roubo de votos é na apuração e não na urna.
      Tenho convicção que já fizeram isto em 2014. Só erraram no cálculo de quantos % precisariam roubar.

      Para mim a Dilma venceu por muito mais votos do que divulgaram.

    • Espetacular comentário. Lucidez e diagnóstico preciso. O povo foi defenestrado de qualquer poder por nossa Oligarquia. Não lembro de um golpe de Estado tão perfeito como este que estamos vivendo. Só queria entender porque esses merdas desejam ver o país rastejando como um verme no excremento. Que adianta, por exemplo, o dono da Havan ter uma Ferrari se o país onde ele vive não vai ter um metro de asfalto decente para ele passear com o possante? Pra quem o dono das Pernambucanas pretende vender, se eles estão arrancando de 80% da população décimo-terceiro, FGTS, adicional de férias, plano de saúde, 50% da renumeração básica? Que conta dos Infernos eles estão fazendo para acreditarem que a economia brasileira vai funcionar quando terminarem de defecar?

      • O empresariado brasileiro, em sua grande maioria senão na totalidade, retira seus lucros da ciranda financeira das bolsas e aplicações em títulos da dívida pública, não da produtividade de suas empresas. Estão mais atentos às flutuações da Bolsa que ao poder de compra dos brasileiros. E estas aumentam o retorno quando tais aberrações políticas acontecem, desde que a economia continue segundo as "suas" regras. Quanto ? fruição de suas posses, a maioria deles não o faz por aqui, pois têm residências em outros países, quando querem gozar a vida o fazem longe do Brasil, país pelo qual tem desprezo e de cuja população nem se sentem membros. Já os pequenos e microempresários, estes estão tão ferrados quanto a maioria do povo brasileiro. Passam sua vida a lutar contra a burocracia e os tubarões que lhes fazem concorrência desigual, tentando manter funcionantes seus negócios. Mas grande parte não consegue.

  • Em breve: os grandes jornais e revistas brasileiros não falarão mais em política. Passarão a publicar receitas de bolos, sobremesas, saladas e alimentos naturais. E, daqui a 50 anos, pedirão falsas "desculpas" e um "mea culpa" cínica.

  • Excelente o artigo. Estou divulgando-o, ao máximo. Lamento apenas que outros jornalistas tão lúcidos quanto Eleonora de Lucena se omitam diante da maior ameaça que já pairou sobre a nação brasileira.

    #Haddad13

  • Preciso do link na folha para poder enviar para os coxinhas pois eles só acreditar se vier da fonte original!

  • Todos estão avisados. Alguns ainda pensam que Bolsonaro amansará quando meter a faixa nos peitos. Nem sequer pensam no que vão fazer muitos grupos de toda espécie de psicopatas que se sentirão vitoriosos com Bolsonaro e agirão por conta própria para cumprir as ameaças do discurso e seguir o pensamento do chefe, que em última análise será matar pelo menos 30 mil e muitos inocentes, sem sentirem culpa alguma. Os totalmente imbecilizados dizem que os petistas não suportam quem pensa diferente. Ora, quem é que suporta aqueles que pensam em torturar e matar quem pensa diferente deles?

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