Os 756 mil "sem-escola"

Há 30 anos, quando Leonel Brizola e Darcy Ribeiro lançaram o programa de construção dos Cieps, houve muita gente que, não podendo ser contra construir escolas, achava 1001 subterfúgios para criticar a obra generosa de Oscar Niemeyer para nossas crianças.

Alguns argumentos, até, supostamente “progressistas” e “pedagógicos”:

– O importante não é o prédio, mas o projeto pedagógico! Com um bom projeto se pode ensinar até na sombra de uma mangueira…

Óbvio, uma asneira. Porque não apenas o programa onde se inseriam os Cieps visava uma mudança completa na forma de educar quanto a adequação entre método educacional e o espaço onde este se realiza tem tudo a ver. Lógico que alguém pode ter um bom atendimento médico na barraca de lona de um hospital de campanha, em emergências. Mas alguém é louco de dizer que não se deve ter bons hospitais para a população porque, com um bom projeto terapêutico, se pode curar pessoas até numa barraca de lona por anos a fio, como é a vida escolar?

Hoje, o Estadão publica matéria sobre o fato de, com base no Censo Escolar pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) e Federal de Santa Catarina (UFSC) terem encontrado 756 mil crianças estudando em “barracões, paióis, galpões, igrejas e na casa de professores – mas não em um prédio escolar.”

Pior ainda:  “descobriram que 44% das escolas brasileiras têm apenas o básico: água encanada, sanitário, energia elétrica, esgoto e cozinha. Nada que, a princípio, configure o funcionamento de uma escola”.

Segundo os pesquisadores, “Só 0,6% das unidades de ensino do País têm prédios considerados completos, com biblioteca, quadra, laboratório e acessibilidade.” Ou seja, tudo que havia num Ciep .

Um dos pesquisadores, o professor Joaquim Soares Neto, da UnB, “é certo que a precariedade afeta o desempenho do aluno”. “Mas agora estamos tentando ; ver o quanto a infraestrutura impacta o aprendizado”.

Bem, professor, o ranking do Ideb no Rio de Janeiro mostra que os dois dos cinco melhores resultados do Estado entre as escolas públicas de 1a. a 5a. séries foram conseguidos por Cieps, o Gláuber Rocha, na Pavuna e o Pablo Neruda, na Taquara, Jacarepaguá.

E isso com boa parte do abandono e até perseguição que estas escolas sofreram durante anos, por serem uma lembrança de Brizola que precisava, para muitos, ser destruída.

É curioso que imitar o sambódromo, outra obra genial da trinca Darcy-Brizola – Niemeyer, não houve cidade – grande ou pequena – que não quisesse…

Mas fazer educação de qualidade em prédios de qualidade, ah, aí é obra faraônica…

Essa gente que abre manchetes sobre uma ou outra baboseira que possa escrever um estudante nas redações do Enem, que estaria em crise porque um aluno tirou nota 5 por que  incluiu o hino do Palmeira na redação, não se escandaliza nem um pouco com a sujeição de mais de 750 mil crianças a estudar em um lugar que não é nada, nem mesmo um escola, que o brasileiro se acostumou a ver como “um lugar qualquer”.

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Uma resposta

  1. A elite é cínica e hipócrita. A mesma contradição vemos quando tomamos o histórico dos ataques ao PT. Na década de 90 diziam: “Ah, esse partido só tem universitário e classe média, não tem trabalhador”. Agora, com o PT no governo, dizem: “Ah, esse partido só tem voto de pessoas sem cultura. Pessoas de classe média e universitários não votam no PT”.

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