Os ‘sub-uber’ da modernidade selvagem

Henrique era caminhoneiro. Leandro era copeiro de um hospital; Natanael dava duro num restaurante, ganhando pouco.

Os três são personagens da ótima reportagem 12h por dia, 7 dias por semana, R$ 936: como é pedalar fazendo entregas por aplicativo, de Renato Jakitas, no Estadão, que traz o cotidiano e o perfil dos 30 mil “bikeboys” de entrega no centro de São Paulo.

Um perfil desse trabalhador foi traçado em junho pela Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike), coordenado pelo instituto Multiplicidade e apoiado pelo Laboratório de Mobilidade Urbana da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Após entrevistas com 270 ciclistas em São Paulo, o levantamento concluiu que 75% desses profissionais têm idade entre 18 e 27 anos e, como Samuel Marques, pedalam cerca de 12 horas por um salário médio mensal de R$ 936. Realizam diariamente dez entregas, a R$ 5 cada. Seis em cada dez ciclistas trabalham todos os dias da semana, sem folgas.

Esqueçam folgas, direito trabalhistas, seguro contra acidentes, auxílio-alimentação ou transporte.

Esqueçam até a gorjeta, que não existe para a maioria deles. ““Quando as pessoas pedem uma pizza em uma pizzaria conhecida, o motoqueiro entrega e é bem recebido, ganha até caixinha. O entregador de aplicativo é invisível. As pessoas nem olham para nós”, diz Leandro.

A modernidade selvagem é até “bem-vinda”: a alternativa a ela é o desemprego.

E não venham com ideias malucas de regulamentar esta atividade e impor limites a esta escravidão sobre rodas.

Afinal, o presidente da República já decretou que é melhor trabalho sem direitos que direitos sem emprego, não é?

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21 respostas

  1. Antes do PT, era comum ouvir aqui na roça (sertão baiano) o conhecido “é melhor ganhar dez do que nada”.
    Veio o Lula, bolsa família, salário mínimo valorizado e o sertanejo já não trabalhava mais pelos dez. Começaram então a dizer que o bolsa família incentivava a preguiça.
    Logo haverá gente trabalhando por um prato de comida e então alguém dirá que é melhor ganhar a comida do que passar fome. E, quem sabe, ainda gritar “mito, mito”

    1. Quem ganha menos consome menos.
      Menos salao de beleza
      Menos tv por assinatura
      Menos cursinho
      Menos faculdade
      Menos viagem de ferias
      Menos dizimo pro pastor
      Menos roupas legais
      Menos celulares novos

      1. Opa, opa!!! Pera lá!!! Como assim “menos dízimo pro pastor”??? Esse tem que estar GARANTIDO igual ao salário dos procuradores que acham o que querem e dos juízes que não têm provas, mas a jurisprudência permite condenar, que serão perdoados por seus erros agora que defendem o Estado de Direito, mesmo mantendo Lula preso pra não atrapalhar o governo Bolsonaro a acabar com os direitos de pessoas como os personagens da reportagem. Depois a esquerda volta ao poder, recebe outro golpe, e a gente fica se perguntando o que aconteceu quando a resposta é obvia: fazemos aliados de ocasião.

      2. Pois é Flavio….os direitistas selvagens adorariam que existisse capitalismo sem consumidor….Mas infelizmente, as tais leis economicas pouco se lixam para as crenças das pessoas. Vai daí a crise que vai se aprofundando.

    2. Ari….uma vez peguei uma corrida com um velho taxista de SP. Ele detestava a Dilma, ouvia a viagem toda a Jovem Pam….e aquela lenga lenga abjeta.

      Mas quando falei do LULA….o homem se transformou…

      Disse que no sertão de onde ele veio, também na velha e boa Bahia, quem tinha bicicleta estava de moto, quem tinha moto , comprou carro, quem tinha carro….comprou mais um naco de terra.

      Vacas de leite, carneiro, bode, galinha…..tudo. O LULA tinha transformado o sertão.

      Hoje NOSSO LULA tá preso….só o sertão lhe é fiel. O resto dos alienados gritavam e alguns ainda gritam MITO, quando o bozo defeca alguma pela boca imunda….

      Taí o resultado, não vamos ser Cuba ou Venezuela….vamos ser o Gabão.

  2. Eu acredito que o sistema capitalista deve estar em sua forma mais selvagem nos dias recentes frente a alavancagem desses ultraliberais populistas Brazil e mundo a fora. Acredito que o sistema como é hoje está a beira de um colapso e no desespero de faturar o máximo possível antes da derrocada os grandes donos do capital estão empenhados doa a quem doer.

    Ontem vi uma notícia sobre o Jeff Bezos, dono da Amazon ou algo assim, que iria retirar os planos de saúde de seus funcionários de uma divisão de alimentos integrais. Em uma dessas reportagens, afirma a pessoa que o Bezos fatura cerca de 3200 dólares por segundo para ele, fruto de seus negócios. Por curiosidade fiz uma conta e cheguei a um resultado que em um dia o que Bezos fatura seria o suficiente para prover um salário de U$3200 do 0 aos 80 anos para 90 pessoas, em um mês 2700 pessoas da mesma forma (não estou falando em familia, mas por pessoa, o número poderia ser maior).

    Por mais meritocrata que possa ser uma pessoa, a não ser que seja um cínico e hipócrita, espécie encontrada aos montes aqui no país, não tem como olhar para essa tremenda desigualdade e achar que é normal, que não estamos diante de uma tremenda injustiça, de um sistema totalmente desigual e fracassado. O Brazil pós golpe foi engolfado por esse pensamento, ao ponto do pobre ganhar uma merreca, sustentar o bolso gordo do capital e, ainda por cima, achar que é rico ou de aceitar o engodo do “ou direitos ou emprego”. Essa é a grande tragédia para o país.

  3. Tem alguma coisa errada nessa reportagem…

    Não é possível que eles pedalem 12 horas para fazer apenas 10 entregas por dia.

    Fui ler o artigo, e… bingo! Ele se desmente um pouco depois:

    “Os ciclistas ficam parados por um período muito longo, por conta da baixa demanda fora dos horários de pico.

    O serviço, segundo os aplicativos, está dividido basicamente em dois momentos – na hora do almoço e na do jantar”

    Seja como for, é ruim; estas pessoas ficam disponíveis para o serviço até 12 horas por dia.

  4. Notem que a reportagem não diz, mas pessoas que hoje tem entre 18 e 27 anos nasceram ou eram crianças em 2003.

    Essas pessoas, diferente de quem tem mais de 30, não conheceram o Brasil e a única referência de existência em sociedade que possuem era os áureos tempos de Lula e Dilma, quando existia alguma esperança de o Brasil ter superado aquele passado de miséria e fome.

    Para essas pessoas, só o que tenho a dizer é: Isso é o Brasil e é contra isso que lutávamos. É contra isso que existem artista, intelectuais, professores e outros tantos trabalhadores mobilizados contra essa desgraça que se abateu no Brasil pós golpe.

  5. Esses são todos os pobres de direita que viraram os novos EMPREENDEDORES e usam suas bikes como Startups de grandes negócios, no inovador VERGONO, digo GOVERNO do grande Cocô presidente ,que exorcisou o SATÃMUNISMO do corpo desses felizardos.
    Parabéns idiotas.

    1. Interior do Brasil ta repleto de pobre que tem odio a pobre principalmente SP MS SC PR
      Nas capitais do Nordeste tb, basta ver a votaçao do Haddad em várias delas

      1. A idéia da “meritocracia” e de que se voce for “o cara esperto” vai se dar bem na vida, é uma crença que foi plantada na cabeça das pessoas de maneira incessante por todos os meios de informação….É o pote de ouro no fim do arco iris. Ou a cenoura na frente do burro. Ninguém explica para a maioria, que o sistema economico, tal qual um sistema mecanico impessoal, é um sistema de exclusão. Ou seja, para que alguém ganhe, alguém tem que perder….O pobre nesse contexto, é o perdedor. E o ódio aos pobres, não passa do medo constante de acabar sendo um deles.

    2. Sim! Agora basta apoiarmos entusiasticamente Reinaldo Azevedo e Gilmar Mendes pra sairmos dessa cilada… e cairmos na do Doria ou Huck, que serão protegidos pelo próximo justiceiro pra continuar a implantar essa “modernidade”.

  6. “O termo precariado foi usado pela primeira vez pelos sociólogos franceses nos anos de 1980, para descrever os trabalhadores temporários e sazonais”, segundo Guy Standing, no seu livro O PRECARIADO – A Nova Classe Perigosa, Autêntica Editora Ltda.
    Devemos entender o precariado como um neologismo formado pelo adjetivo Precário e o substantivo Proletário.
    ” o precariado tem característica de classse. Consiste em pessoas que têm relações de confiança mínima com o Capital e o Estado, o que o torna completamente diferente dos assalariados” . E ela não tem nenhuma das relações de contrato social do proletariado, por meio do qual as garantias de trabalho são fornecidas em troca de subordinação e eventual lealdade, o acordo tácito que serve de base para os Estados de bem-estar social”, conforme o autor acima citado.
    “Na Itália, o termo precariato tem sido empregado para significar mais do que apenas cumprindo tarefas casuais e com baixas rendas, indica a existência de vida precária como um estado de vida normal.”
    No Japão, o termo tem sido usado como sinônimo de trabalhador pobre, inclusive há um grupo de jovens trabalhadores conhecidos como ” freeters ” combinação de FREE (livre) e Arbeiter, palavra alemã para trabalhador, ou seja aquele que tem casualmente um emprego.
    Esse excesso de trabalho está levando a sociedade do Japão a uma doença chamada KAROSHI e com ela o aumento do número de suicídio.
    No Brasil a famigerada rede Globo chama a esses desempregados que fazem qualquer coisa para sobreviverem de Empreendedores, coisa que Ricardo Antunes, no seu livro O PRIVILÉGIO DA SERVIDÃO, BOI TEMPO EDITORIAL denomina de
    ” burguês de se próprio” e de ” proletário de si mesmo”. E assim o capitalismo e o neo-liberalismo vão destruindo os direitos sociais e a classe trabalhadora.

    1. Venho citando Standing há algum tempo em meus posts, mas não deixa de ser sempre alvissareiro ver que muitos o leram, mesmo em uma edição de pequena tiragem como a brasileira.
      E o “karoshi” brasileiro já está começando, haja vista os ótimos artigos de Danilo Tomaz e Robin Chancer para a Época e da sempre excelente Eliane Brum para o El Pais:
      https://epoca.globo.com/como-manter-sanidade-apesar-da-politica-23945269
      https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08/01/opinion/1564661044_448590.html

      Pergunto-me a cada dia se já não é tarde demais para evitar o pior, se já não o vemos debaixo dos olhos…

  7. Com pouquíssima oportunidade de acesso a outros conhecimentos, a informação de qualidade, a contatos pessoais menos competitivos, é provável que essa galera seja determinante na manutenção do atual estado de coisas, conservador, violento. Daqui a pouco, vai ser muito difícil o diálogo.

    1. Como parodiou o Xico Sá, no El País, “ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal, ainda vai tornar-se um imenso Bacurau…”

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