Seu Manuel e o Big Mac

Em 1986, a The Economist criou um índice original para verificar a paridade do poder de compra de cada moeda nacional: o índice Big Mac, que comparava o preço do gorduroso sanduíche da rede americana espalhada pelo mundo.

Mesmo totalmente anticientífico, o indicador tem lá a sua utilidade ilustrativa. Mostra que, mesmo com a recente alta do dólar, ainda temos uns 25% de defasagem com o dólar, se considerarmos os ilusórios tempos do US$ 1 = R$ 1.

Mas ontem, a Folha publicou uma matéria que faz pensar em outra visão do índice Big Mac.

xmanuel

É uma reportagem sobre um português chamado Rui Manuel, dono da padaria Portugália, que vende um “cheeseburguer salada”, conhecido como “Fome Zero”, a R$ 2,00.

Um gráfico da Folha mostra os custos dos ingredientes  e o lucro bruto do “seu” Manoel, que corresponde a mais de 36% do preço de venda. Claro que “seu” Manuel ainda tem de pagar impostos, loja, empregados. Mas lembremos de, junto com os 1200 “Fome Zero” que ele vende por dia, vende também refrescos, refrigerantes e atrai uma imensa clientela para sua padaria.

Aí eu tive a curisidade de ver quanto custa um cheeseburguer no McDonald’s que, é obvio, negocia em grande escala e compra ingredientes muito mais baratos que os que o “seu” Manoel adquire sem qualquer poder de negociar preços.

Batata: R$ 4,00! E isso porque entrou em promoção no final de maio…

Ainda que o McDonald’s comprasse os ingredientes pelo mesmo preço que paga o “seu” Manuel, o lucro bruto seria de 68% sobre o preço de venda!

Os anos e anos em que esse país pertenceu apenas a suas elites, com uma pequena classe média que, pelo tamanho da população brasileira, gerava algum mercado interno nos acostumaram a uma margem de lucro alta e com a baixa competitividade. A concentração empresarial que veio com a “onda” neoliberal agravou e acentuou essa distorção.

Isso explica a margem de lucro absurdamente alta de setores como a indústria automobilística, a farmacêutica, os serviços bancários e o de telefonia, este último atirado totalmente à fúria do mercado pelos governantes.

O “seu” Manuel da padaria não tem como entrar nesses ramos, nem o capital brasileiro é capaz de fazer isso. Resta o poder regulador do Estado, mas isso se constitui num tabu maldito para porta-vozes (e beneficiários) deste modelo perverso.

Mas há outros – e muitos – em que  pode ser amenizado o vício de ganhar muito vendendo pouco.

Talvez parte do empresariado brasileiro precise tomar lições com o “seu” Manuel da padaria.

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