Essa história da soltura do traficante preso por falta de justificativa formalizada da continuidade de uma prisão preventiva, se não estivesse sendo tratada com demagogia histérica deveria ajudar a ver o que temos de monstruoso no sistema prisional brasileiro.
O gráfico aí de cima faz parte de um estudo do Ministério da Justiça e do Ipea, alguns anos, atrás mostra a duração das prisões preventivas no Estado da Bahia e Santa Catarina (é igual em todos os outros) para os acusados de crimes de furto, roubo e tráfico.
No geral, a prisão preventiva média (média, senhores e senhoras, não as maiores) durava 833 dias (dois anos e três meses) na Bahia e 670 dias ( 1 ano e dez meses). E chegando, no caso de tráfico, em Santa Catarina, a 1.812 dias (cinco anos e 15 dias).
E não se alegue que isso era cumprido como “antecipação de pena”.
Na Bahia, dos réus absolvidos, mais de 85% gramaram cadeia e em Santa Catarina, foram 65.8% dos que foram declarados inocentes os que pegaram cadeia, nas condições de humilhação que você pode imaginar.
E isso não foi por um dia ou outro, não. Na Bahia, foram 394 dias (um ano e um mês), em média, de “cana” para que foi julgado inocente, chegando a 970 dias (um ano e oito meses), nos casos de roubo. Entre os catarinenses, a média foi, entre os absolvidos, de três meses de cadeia injusta.
Isso, repita-se, na média, o que significa que muitos cumpriram muito mais.
A morosidade e a desídia com que se trata a liberdade do cidadão não podem ser perdoadas com o argumento de que “tem muito bandido ali”. Prender um inocente um dia é muito ruim. Prender milhares, por meses, é monstruoso.
Juízes e promotores, com raras e honrosas exceções, deixam presos mofarem na cadeia, enquanto gozam de seu trabalho, frequentemente, de terça a quinta, de dois meses de férias e de, sobretudo, uma política de encarceramento que – mostram os números de absolvidos que pagaram cadeia, e muita – é exagerada e sem critérios, porque quase todos são pobres, pretos e desprezíveis aos olhos de suas excelências.
No tempo dos processos de papel, havia um carimbo que se apunha sobre a capa dos processos: “Urgente- Réu Preso“. Agora, com a Justiça informatizada, não é possível que não se marque um “bip” para avisar dos prazos de renovação de prisões – prisão é sério, doutores! – e, se não achar motivos para a reclusão, ainda existem os meios de colocar em liberdade vigiada, com tornozeleiras, no caso de restarem dúvidas sobre a disposição de fuga.
O que se está fazendo, infelizmente, tem toda a pinta de uma sabotagem em que, infelizmente, Marco Aurélio de Mello “embarcou”. Criar o escândalo público para justificar o que desejam: cadeia para qualquer um, pelo tempo em que quiserem deixar, sem nem explicar porquê.
E a mídia, tão linchadora quanto, segue com gosto na aventura.