Alguém acredita da insinuação de Jair Bolsonaro de que não será candidato em 2022 por não ver possibilidades de ver aprovado – como ele próprio admite que não será – o voto impresso nas eleições presidenciais?
Vejam o que ele diz, segundo a Folha de S. Paulo:
“Eu entrego a faixa para qualquer um, se eu disputar a eleição, né? Se eu disputar, eu entrego a faixa para qualquer um. Uma eleição limpa. Agora, participar de uma eleição com essa urna eletrônica… Alguns falam: ‘Ah, o Bolsonaro foi reeleito tantas vezes com o voto eletrônico’. As mesmas pessoas que tiraram o [ex-presidente] Lula da cadeia e [o] tornaram elegível vão contar os votos dentro do TSE de forma secreta. As mesmas pessoas”.
Isso é o que pode ser recuperado do que falou, por ter sido publicado, com edições, por um canal bolsonarista, porque a imprensa não tem condições de cobrir o que ele diz no “cercadinho” e apoiadores levado à porta do Palácio da Alvorada, claro.
Todo o discurso de Bolsonaro hoje – e cada vez mais, à medida em que a crise do país se aprofunda – é o que ele é perseguido, manietado, impedido de fazer o que disse que iria fazer por sucessivos “inimigos”, de uma grande conspiração.
Bolsonaro, é verdade, pode até desistir da disputa, mas nunca por esse motivo, mas para, em cima da hora, alegar fraude para evitar uma derrota acachapante que se desenhe – e está se desenhando – na eleição presidencial.
Não faz parte da sua mente a disputa política limpa, mas tumultuada, a ganha “no grito”, nas pressões e, em última análise, e se puder, na força armada. E criará tal ambiente em que os que não concordarem com isso devem estar prontos para deixarem de “mimimi” e defenderem a democracia e o resultado eleitoral.
O seu roteiro, quando está ficando evidente a impossibilidade de uma reeleição é pôr-se como vítima do sistema – o mesmo que o elegeu em 2018 – e no qual não logrou se adaptar-se e ampliar sua base política mesmo com a votação imensa que teve.
Bolsonaro está mais que nunca na disputa e por isso procura o papel de vítima de conspirações e fraudes que cria em sua própria cabeça e na cabeça dos seus apoiadores.
Mas cria, com isso, mais confusões e ambições, com um monte de políticos acreditando que pode haver uma saída senão a do confronto entre ele e Lula, o que faz surgirem delírios estapafúrdios, como a de uma candidatura do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, macarrão sem sal e sem molho da política, que é do DEM, mas sairia candidato pelo PSD.
Há uma grande leva de gente na política querendo fazer crer que as coisas não são como são: existem um núcleo fisiológico e reacionário que gravita em torno de Bolsonaro e um sentimento de oposição que tem em Lula o centro magnético da insatisfação popular.
O resto, quando não é marola, é hipocrisia que se dissolve com a realidade.