O russo Pavel Durov, no comunicado distribuído ontem, reconhece literalmente a sua “negligência” e se dispõe a, finalmente, obedecer decisões judiciais.
Nem sequer contestou a decisão de suspender o funcionamento da plataforma Telegram, apenas fez um apelo para adiar a punição por alguns dias, para ter tempo de cumprir as decisões do STF.
Mas Jair Bolsonaro, mais realista do que o rei, mandou a Advocacia Geral da União recorrer à ministra Rosa Weber – que é relatora de um processo onde se discute a legitimidade de suspender aplicativos de mensagens – para derrubar a decisão de ontem no ministro Alexandre de Moraes, servindo-se de um entendimento, expresso no relatório de Weber, de que não há previsão legal para que isso possa ser determinado judicialmente.
Pouquíssimo provável que Weber o atenda, não só porque não se cassa, monocraticamente, decisões entre ministros como, também, porque voto em julgamento inconcluso, como é o caso, não firma jurisprudência.
Isso, tecnicamente. Politicamente, porque Weber dificilmente fará, a seis meses da eleição, uma manifestação que seja interpretada como autorização para um “vale tudo” nas redes sociais – e não apenas o Telegram – que, desoneradas de sofrerem sanções, vão rebaixar os seus controles – e os gastos com eles – de monitoramento de conteúdo.
De toda forma, resta evidente para quem quiser, a importância vital que Jair Bolsonaro atribui ao uso intensivo do Telegram como ferramentade sua campanha não só como meio de divulgação e manifestação de suas ideias, mas para usar da franquia que o aplicativo permite, ao tolerar grupos de mensagens com até 200 mil integrantes, como ferramenta de disparos em massa de propaganda, muitas vezes absolutamente mentirosas, nas redes sociais.
A 200 mil integrantes por grupo, são 20 milhões em apenas 100 grupos – basta um agente para administrá-los e abastecê-los – e criar ondas de desinformção. Conte, ainda, com o fato de que, por ali, facilita-se a burla dos mecanismos de controle de outras mídias sociais onde, em escala menor, mas já aplicada sobre uma base imensa, o conteúdo gerado no Telegram.
O pedido do governo a Rosa Weber, por vedar punições ao descumprimento de ordens judiciais, significaria, se aprovado, o direito de qualquer plataforma de, simplesmente, ignorar as determinações da Justiça pois não lhe poderia, nos termos da representação da Advocacia Geral da União, ser imposta qualquer punição.
Estaríamos criando uma categoria de mídia que, como nenhuma outra empresa no mundo, estaria dispensada de cumprir ordens relativas a quem as utiliza com conteúdo potencialmente criminoso.