Bolsonaro não é “dúbio”, é golpista

Jair Bolsonaro, finalmente, voltou a falar. Não a falar claramente, mas isso já seria pedir demais pois está de tal forma aferrado a ideias golpistas que não pode falar o que deveria falar alguém que perdeu uma eleição: reconhecer a vitória alheia, desejar boa sorte ao eleito e colocar acima de tudo o desejo e o interesse da sociedade.

Está, nos ritos da democracia e em seu conteúdo, tudo errado na reaparição pública de Jair Bolsonaro como estão erradas suas aparições exclusivamente em solenidades militares. Tão pródigo em lives ao longo de seu mandato, ele não teria nenhum tipo de dificuldade em fazer um pronunciamento público, dirigido a todos os cidadãos do país que ele ainda preside, em lugar de fazer isso diante de um amontoado de fanáticos convocados para a frente do Palácio da Alvorada.

Embora Folha e O Globo tenham usado a mesma expressão para definir o discurso de Bolsonaro – ” declarações dúbias sobre pedidos de intervenção militar” -não há nenhuma dúvida sobre seu significado, ainda que ele não o tenha explicitado.

Aliás, até sua postura corporal, com as mão cruzadas às costas, em tudo trazia-lhe a imagem de “ordem unida”, falando à pouca tropa de pobres sandeus que ainda reúne para estas patacoadas. Ainda mais na companhia do general Walter Braga Netto, chefe militar de fato do país e acompanhante permanente do “mito”, mesmo sem cargo algum no governo.

Não é preciso ser vidente para entender que o ainda presidente deseja esta intervenção anômala das Forças Armadas, tanto quanto está evidente que ele não tem condições militares ou políticas de consumá-la.

Quanto a dizer que está “arriscando a vida no meio do povo”, é apenas mais uma farolagem vitimista e ridícula de quem quer se fazer de herói, mesmo bem protegido por seu aparato de segurança. Aliás, é no mínimo curioso que um homem que se dedicou a espalhar, em quatro anos, dois milhões de armas dos mais potentes calibres à população venha falar de segurança contra atentados.

Ninguém está ameaçando Bolsonaro de coisa alguma e, se ele teme estar sujeito às penas da lei, isso é apenas consequência de vivermos em um Estado Democrático, onde a lei vale para todos.

O atual presidente, fora do poder, não será – como nunca foi – um player legítimo de um regime democrático, porque assim não é quem anuncia projetos políticos com “fuzilar”, “metralhar”, “mandar para a ponta da praia” seus adversários.

Este discurso não é mais aceitável na democracia nos tempos em que vivemos e não pode ser invocado em nome da “liberdade de expressão”.

Mas o que acontece é ainda pior do que o “Bolsonaro sincerão” no seu autoritarismo. É a linguagem cifrada, clara o suficiente para atiçar o golpismo e obscura ao ponto de ainda servir como proteção a alguém que, do alto do cargo que ainda ocupa – o de comandante em chefe das Forças Armadas – o usa para chantagear e intranquilizar a Nação, aliás contando para isso com a cumplicidade de comandantes militares.

Golpismo não é uma posição política legítima, é um crime.

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