Quem quiser consultar o acordo firmado entre a Pfizer e o Estado de Israel vai ver – bem, vai ver sem ler – vários trechos tarjados de preto, a exemplo deste aí em cima, a verdades sobre a exclusão de responsabilidades por eventuais efeitos adversos da vacinação, que já se tinha, então, a certeza de que só ocorreriam de maneira estatisticamente insignificante.
A tinta preta não esconde, antes revela, o que o texto contém.
Foi graças a isso e à promessa israelense de dar acesso aos dados médicos dos vacinados que o país conseguiu o fornecimento de doses em quantidade para vacinar sua pequena população – menos de 10 milhões de habitantes – em tempo recorde, através de seus sistema de saúde – uma espécie de SUS público privado, onde o plano de saúde é pago pelo Estado e oferecido através de quatro operadores privados – Clalit, Macabi, Meuchedet e Leumit – é gratuito e se paga um plus ( nada maior que 200 reais, na maioria dos casos) para serviços “extras”, os não cobertos pelas modalidades básicas.
O Brasil fez, em parte, o mesmo e permitiu a realização dos estudos de fase 3 – em grande número de pessoas – para a Pfizer e para a Janssen, tanto quanto para a Astrazêneca e a Sinovac, porque o país, pela quantidade de habitantes e pelos altos níveis de transmissão da Covid, era o melhor “campo de prova” para os testes vacinais. Critério que, aliás, Israel não atendia.
O governo israelense se lixou para as existência de limitadores de responsabilidade sobre a vacina, seja porque não havia razão para crer que alguém fosse “virar jacaré” por conta de vacinar-se, seja porque nenhum tribunal, em parte alguma do mundo, iria aceitar que uma farmacêutica gigante se livrasse de responder por efeitos adversos de uma vacina fornecida aos milhões, é evidente. Cláusula leonina, imposta à parte como condição para fornecimento essencial não sobrevive nem na Corte Suprema de Zâmbia.
O importante era ter vacina, e rápido.
Aqui, o governo não a queria e, por isso, agarrou-se às tais cláusulas de limitação de responsabilidade para rejeitar, várias vezes, o fornecimento de imunizantes e menos ainda lutou para que as cotas de fornecimento fossem aumentadas e antecipadas.
A reportagem da Folha mostrando que Eduardo Pazuello recusou por três vezes as ofertas da Pfizer – que ainda podiam ser melhoradas em quantitativos e prazos é a prova destas afirmações e, pior, ratificada pelo fato de ter feito o mesmo com a vacina da Sinovac/Butantan.
Aí está a razão de que ter-se, hoje, 60% dos israelenses vacinados – e dois terços deles já com a 2a. dose – e termos chegado aqui apenas a míseros 4%.
Agora, Bolsonaro manda a “Missão Spray” para Tel-Aviv e, ao contrário das declarações, com o objetivo de recolher alguma xepa, sobras da vacinação que, lá, termina em duas semanas, até porque tem eleição dia 23 de março e Bibi Netanyahu de bobo nada tem. É mesmo possível que sobrem, porque o país tem pelo menos 50% de doses compradas além das necessárias para seus 10 milhões de cidadãos.
Ainda assim, óbvio que o volume é pequeno, mas qualquer coisa vale para não faltar com que seguir com a nossa Operação Conta-Gotas de vacinação.