A Globonews fez ontem à noite um “debate” entre candidatos a presidente, na forma de uma entrevista conjunta com Ciro Gomes, Luiz Henrique Mandeta e Alessandro Vieira.
É muito bom que a TV abra espaço para o debate político, mas é revelador que não seja para todos.
Lula lá, nem pensar.
Ou melhor, Lula lá, sim, mas só para apanhar, porque boa parte do programa foi dedicada a criticá-lo e acusá-lo.
Quando muito, teve a correta observação do comentarista Otávio Guedes de que comparar, na mesma condição, Lula e Bolsonaro era improcedente, por conta de que o primeiro nunca foi golpista e aceitou, mesmo no impeachment de Dilma e na própria ordem de prisão de Sérgio Moro, as regras institucionais.
Vieira e Mandetta, ex-bolsonaristas, só confirmaram esta postura.
O primeiro disse vir da “safra” de parlamentares de 2018, como se tudo o que se produziu naquele ano não tivesse o “sabor Bolsonaro” que se espalhou nauseantemente por todo o pleito. Aliás, ele próprio se confessa um apoiador arrependido do atual presidente.
Mandetta – tão próximo do bolsonarismo que mereceu um dos mais importantes ministério do governo – caiu na mesma vala comum apontada por Otávio Guedes, referindo-se aos dois igualmente como “figuras nefastas”.
Mas foi Ciro quem – depois de integrar o governo Lula como ministro e até insinuar apoio ao PSDB se Aécio Neves fosse o candidato em 2010 (foi José Serra, seu inimigo figadal) – quem me despertou maior repugnância.
Culpou Lula e o “lulopetismo” pela ascensão de Jair Bolsonaro que, segundo disse, não existiria sem a crise econômica do período Dilma e sem “a roubalheira instalada no centro do poder” nos governos petistas.
Já nem é o caso de perguntar porque Ciro esperou tanto tempo, estando no centro do poder, para vê-lo.
Mas o seu argumento me trouxe à mente o que se fazia com Leonel Brizola, o criador do partido onde Ciro está gora hospedado. Certa direita, como que para justificar a ditadura, dizia que ela só tinha acontecido porque Brizola e a esquerda tinham “radicalizado” antes de 64 e, portanto, seria o responsável pelas desgraças que nos advieram do golpe.
É a atitude torpe de quem, diante do intolerável, acaba por culpar a vítima pelo crime. “Foi ele que provocou”, diz este tipo de gente covarde que, exatamente como observou o correto comentarista da Globonews, faz tábula rasa entre um energúmeno por toda a vida autoritário e uma liderança, nascida no seio do povo e que sempre se pautou pelo respeito à democracia.
Embora não se possa esperar muito e quem se omitiu no momento que que todos deveríamos estar mobilizados para impedir a chegada do fascismo ao poder, repugna ver quem, por simples ambição e egoísmo político se furta de reconhecer a diferença essencial de Lula para Bolsonaro.
Bem, se Ciro não sabe, o eleitor brasileiro parece saber, e cada vez mais. Repito o que já dissse: em matéria de antipetismo, se pretendem legitimar-se por esta via, Bolsonaro é “melhor” que eles nesta matéria.