Num país carente de recursos para investimentos públicos, o FGTS sempre foi uma das raras fontes de financiamento para habitação e para o saneamento.
Sempre teve, é certo, problemas de gestão – durante toda a década de 80 e boa parte dos anos 90 ficou esgotado e sem recursos para investir – e de direcionamento: mirou por muito tempo o financiamento da moradia para a classe média e deixou explodir o déficit habitacional entre os pobres.
Agora, porém, o que se anuncia é, numa palavra, a destruição completa do Fundo.
Nos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro, no total, as liberações de recursos do FGTS como “analgésico” para a crise de empobrecimento da população e reativador pontual do consumo, somaram perto de R$ 90 bilhões.
Este era o valor que, em julho, faltava para honrar os contratos de financiamento de todos os projetos aprovados pelo Fundo para habitação, saneamento, infraestrutura e saúde, para o período de 2019 a 2022.
O anúncio do fim da multa de 10% sobre demissões imotivadas, além de ter criado uma “janela de oportunidade” para a demissão de trabalhadores – especialmente os com mais tempo na empresa, que acumulavam saldos maiores de FGTS – tira algo em torno de R$ 6 bilhões das receitas do Fundo e, por óbvio, de suas disponibilidades de financiamento.
Não pense que isto está sendo um movimento isolado.
Habitação e saneamento têm a porteira aberta para ficarem no “filé mignon” com o espaço que o financiamento estatal direcionava para os mais pobres.
Embora positiva, as taxas de juros imobiliárias a algo entre 7,5 e 10% de custo efetivo total (taxa, mais seguros e custos) ainda estão a anos-luz do que pode pagar a população de baixa renda, embora sejam extremamente atraentes para quem dispõe de mais recursos.
No saneamento, o jogo é mais pesado, pois envolve grandes financiamentos prometidos pelo BNDES para assim que o Congresso aprovar o marco regulatório do setor. E como as atuais empresas públicas do setor perderão os recursos do FGTS, o apetite das empresas que estão sendo escorraçadas do mundo desenvolvido por terem fracassado como concessionárias de água e esgoto se voltará para cá.
Escorraçadas? Sim, de 2009 para cá foram mais de 730 reestatizações de serviços de saneamento e coleta de lixo pelo mundo afora, sobretudo nos Estados Unidos e Europa, provocados por deficiência nos serviços.
Aqui mesmo já tivemos caso assim, em Itu. E, recentemente, no Rio, em cachoeiro de Macacu, onde a concessionária abandonou os serviços que o Estado, via Cedae, teve de assumir emergencialmente.
O FGTS, que foi implantado nos anos 60 em detrimento do trabalhador, que perdeu a estabilidade, acabou por gerar um fundo público de investimento. Agora, sem que isso devolva qualquer estabilidade ao empregado – ao contrário, facilitando sua demissão – é aniquilado como forma de “remendar” os efeitos da crise econômica e abrir espaços para a apropriação privada da área de serviços públicos e para devolver a habitação aos tempos em que, para pobre, só barracão e favela eram a saída.
4 respostas
Que paisinho triste e ridículo é o Brasil. Não foi à toa que, como disse a escritora portuguesa, aqui foi eleito o pior presidente do mundo.
Nõ recebo mais noticias do Tijolaço, e não consigo me inscrever para receber, como faço?
A privatização da saúde, educação, infraestrutura, riquezas minerais e recursos energéticos que o Estado implementa, tem um caráter brutalmente excludente: somente aqueles que puderem pagar terão acesso ao progresso e à vida civilizada.Milhares de pessoas serão descartadas dos benefícios do progresso e serão consideradas seres de segunda categoria. Além disso a busca do lucro pelas empresas privadas, implicará sempre na busca da redução de custos a qualquer preço. Em 13 de julho desse ano, um apagão na cidade de Nova York deixou 73 mil pessoas sem luz por 5 horas. O mesmo apagão se repetiu em 22 de julho deixando os usuários irritados com a empresa privada de energia…..Sem recursos para bancar a infraestrutura de serviços públicos, o Brasil provavelmente vai embarcar na onda das privatizações, com os resultados já conhecidos mundo a fora.
Um outro aspecto de acabar com o FGTS sem devolver a estabilidade aos empregados da iniciativa privada é facilitar a extinção da estabilidade do servidor público que se transformaria em “privilégio”