O eleitor vende ou dá o voto?

A Folha dá hoje uma extensa matéria sobre o fato de que, com o tal Auxílio Brasil, Jair Bolsonaro foca o “eleitor que dá triplo de vantagem a Lula sobre Bolsonaro“: pobres, nordestinos e desempregados, “maiores apoiadores de petista” . E que, claro, para ser mais convincente a pressão pelo voto no atual presidente “tem data para acabar: dois meses após o segundo turno de 2022”.

Claro, algum efeito fará, mas é de duvidar que possa ser decisivo.

Há questões objetivas, como o fato de que o alcance é muito distinto do que foi, no ano passado, o auxílio emergencial: nem um terço dos que o receberam durante a pandemia e, agora, num quadro de aceleração inflacionária que castiga uma faixa muitíssimo maior da população.

Mas há outras, subjetivas, típicas da visão da elite sobre o povão, como este fosse um reprodutor da suas próprias deformações: a de que são gente que faz qualquer coisa para “levar vantagem”.

É a mesma deformação que levava à ideia de que o sucesso do Bolsa Família se devia ao fato de que o pobre não queria trabalhar, mas viver de subsídios do Estado.

E que dará seu voto movido pelo “terror” de que, com uma derrota de Bolsonaro, os possíveis R$ 400 deixassem de existir.

Não funciona assim.

É claro que as filas se formarão e têm mesmo de se formar, com o grau de necessidade a que está submetida uma parcela imensa dos brasileiros. Mas o povão é mais esperto do que essa gente pensa.

Sabe que a transferência de renda tem a marca de Lula, não a de Bolsonaro e perceberá claramente que se trata de um arranjo eleitoral e precário e, ao contrário da famosa história do coronel que dá um pé da botina e o segundo só virá se ele vencer a eleição, desta vez o arranjo bolsonarista significará que, depois das urnas, lhes tomem um parte do auxílio.

— Seria muito bom manter isso, mas não tem dinheiro, talquei?

Talvez até saia pela culatra o tiro bolsonarista: com um voto em Lula, o auxílio continua; votando em Bolsonaro, termina em dezembro.

É mais fácil o eleitor dar um voto a quem tem confiança do que vendê-lo a quem sabe ser um chantagista espertalhão.

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