Quem aí se lembra de como, nas eleições de 2010, José Serra chamou o Mercosul de “bobagem”?
Pois lendo o artigo de Mauro Santayanna que reproduzo abaixo você vai entender de onde veio aquela manifestação que muitos não entenderam e perceber como está ali a mesma raiz do destaque que a imprensa brasileira está dando à Aliança do Pacífico, um tratado comercial que engloba o México, a Colômbia, o Peru e o Chile, este ainda governado por Sebastian Piñera, pois Michele Bachelet ainda não tomou posse.
A Aliança do Pacífico é, claramente, um acordo patrocinado pelos estados Unidos que, via México, vai permitir maior acesso dos produtos das outras três nações ao mercado americano.
Claro que nas condições que interessam aos norteamericanos.
Você vai voltar a ver este tema na campanha eleitoral deste ano.
E Santayanna já ajuda você a compreender o porque.
A nova cúpula da Aliança do Pacífico
Mauro Santayanna
Se há uma coisa que muitas vezes, impressiona, em certos segmentos da elite e do empresariado nacional, é a facilidade com que se deixam pautar e manipular pela imprensa estrangeira – e seus replicantes locais – sem entender que por trás de tudo que não seja absolutamente factual, existem determinados interesses.
Esse é o caso, por exemplo, dos artigos e “análises” feitas pela mídia, a respeito da Aliança do Pacífico, que engloba o México, a Colômbia, o Peru e o Chile, e que reuniu-se há alguns dias, em Bogotá, proclamando retumbantemente o corte de 92% das tarifas no comércio entre seus sócios.
A AP está sendo apresentada, dentro e fora do Brasil, como o último prego no caixão do Mercosul, do ponto de vista econômico, e como a aliança que servirá de alternativa – principalmente, ideológica – para os diferentes mecanismos de integração – como a UNASUL e o Conselho de Defesa – que estão sendo promovidos pelo Brasil em nosso continente neste momento.
Em primeiro lugar, é preciso lembrar, Colômbia, Peru e Chile, longe de serem contra o Mercosul, são membros associados da organização – o México tem status de observador – e também da UNASUL e do CDS, o Conselho de Defesa Sul-americano. E o Chile, a partir da posse da presidente eleita Michelle Bachelet, tende se reaproximar do Brasil e do próprio Mercosul.
Acreditar que o Brasil vai perder para o México esses parceiros – com quem dividimos até projetos militares – é ignorar o fator geográfico, e esquecer que já dispomos de acesso facilitado a esses mercados, privilégio que não poderá ser alterado, sob a pena de essas nações também terem seus produtos barrados no mercado brasileiro, o maior das Américas, depois dos Estados Unidos.
Em segundo lugar é preciso relativizar a importância da AP, lembrando, por exemplo, que só o Brasil tem uma economia maior do que a de todos os seus membros reunidos.
E que o Mercosul, como um todo, com a recente inclusão da Venezuela, e um PIB total de 3.3 trilhões de dólares, representaria, se fosse uma nação, a quinta maior força econômica do mundo.
Por trás do mito da Aliança do Pacífico, existe a ilusão de um maior dinamismo da economia mexicana, o principal país do grupo – que cresceu no ano passado 1.2% – com relação à brasileira, a maior do Mercosul – que avançou 2.5% no mesmo período.
Existem mais coisas que definem o lugar que o Brasil e o México pretendem ocupar no mundo – e seus respectivos projetos de desenvolvimento – do que a mera geografia e o volume de exportações.
O México é um país totalmente integrado à América do Norte, e, nessa integração, ficou bom em terceirizar mão-de-obra barata, fabricar refrigerantes, cimento e pão de forma, e prestar serviços de telefonia.
O Brasil é um país integrado à América do Sul e ao BRICS, que privilegia o crescimento de seu mercado interno, tem como principal parceiro comercial a China, e vende para todos os continentes do mundo.
Somos o mais avançado país em pesquisa agropecuária, extração de petróleo a milhares de metros de profundidade, em alto mar, a centenas de quilômetros da costa; em desenhar e fabricar aviões civis de passageiros de até 120 lugares. Produzimos mísseis navais e aéreos, foguetes de saturação, radares e mísseis de cruzeiro.
Dominamos o ciclo do enriquecimento do urânio, fabricamos e possuímos aceleradores de partículas (o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron está em funcionamento e vem aí o Sirius, com 165 metros de diâmetro e 650 milhões de reais de investimentos), e estamos aprendendo a fazer submarinos nucleares, aviões de caça supersônicos e sistemas de transporte a levitação magnética (o Cobra-Maglev da Coppe), por exemplo.
Na internet, alguns mexicanos gostam de apresentar – ao contrário de nós mesmos, que não nos arriscamos a fazer o mesmo – como “mexicana” uma suposta superioridade em manufatura com relação ao resto da América Latina, que se desmente pelos seguintes fatos:
– A quase totalidade das fábricas instaladas no México são de outros países – não existe uma única marca mexicana de automóveis ou de bens de consumo avançados.
– O comércio exterior do México, embora volumoso, é tradicionalmente deficitário.
– A pesquisa e a engenharia de caráter industrial são majoritariamente desenvolvidas em outras regiões do mundo.
– Se não fossem os baixos salários e o mercado dos Estados Unidos do outro lado da fronteira, os mexicanos sequer teriam a sombra do parque “industrial” que possuem.
E não seriam um país exportador, considerando-se que 90% do que fabricam, tem como destino o TLCA – NAFTA (Canadá e Estados Unidos).
Trata-se, portanto, de condições, que não seria possível repetirmos aqui mesmo se quiséssemos – o que não é o caso – ou se viajássemos para a fronteira de Tijuana e regredíssemos de volta no tempo.
Mesmo quando se considera a indústria automobilística, paradigma de uma suposta superioridade industrial mexicana com relação ao Brasil, até mesmo pesquisadores daquele país se recusam a endossar isso.
Esse é, por exemplo, o caso do estudo“Industria Automotriz en México y Brasil: Una comparación de resultados después de la crisis de 2008”, da Dra. Lourdes Alvarez Medina, da UNAM – a maior universidade do México, que conclui seu texto da seguinte forma:
“Respecto a las características de cada industria se observa que México no ha desarrollado marcas propias, importa una gran cantidad de autopartes y componentes y no ha diversificado sus exportaciones ni tiene procesos de innovación importantes. Depende completamente del mercado de los Estados Unidos y ha descuidado su mercado interno.
Brasil por su parte tiene algunos productores locales de autobuses y chasis, tiene una cadena productiva mejor conformada y en algunos modelos tiene contenido local hasta de 90% y sus exportaciones automotrices están muy diversificadas y su mercado interno creció en tiempo de crisis. Además, los autos manufacturados en Brasil consumen gasolina y etanol en diferentes proporciones lo que le da a la flota vehicular brasileña cierta independencia del petróleo.”
Com todo o respeito pelo sofrido passado do México, que perdeu metade de seu território para os EUA, e pelo povo mexicano, sua arte, cultura milenar e literatura, se me perguntassem, principalmente, hoje, se preferiria estar no lugar do México ou do Brasil, ficaria – ao contrário do que muita gente pensa por aqui – na condição em que estamos.
Considerando-se nosso território, população, economia, capacidade de cooperação e articulação, dimensão e projeção geopolítica, ainda é preferível ser o principal país da América do Sul, do que um mero apêndice norte-americano.
28 respostas
O México perdeu metade do território para os EUA.
bom, geográficamente tudo bem. Mas o “território, sob o ponto de vista econômico”, perdeu 100%!
O México foi o único país da AL que não reduziu a miséria e pobreza, ao contrário foi o único onde houve aumento nos últimos anos, a mesma coisa ocorreu com no aumento da renda do trabalhador. O México apresenta salários menores do que na China. Como disse o Lula ao NYT não é esse modelo que queremos para o Brasil.
Se com um liberal no Chile eles não conseguiriam, imagine agora que Michele Bachelet voltará a governar aquele país. Deixa os liberais de direita governarem, pois assim eles demonstraram ao povo que os elegeram como são incompetentes.
A esquerda estabeleceu um padrão muito alto de governança, nunca mais a direita vai governar um país com a tranquilidade que George Bush governou o EUA.
O Brasil (maybe China) é o único país do mundo que NÃO SOBREVIVERÁ a uma economia de mercado. Não com 40% de impostos que viram MENSALÃO… e outras falcatruagens….
Ta na hora de assinar livre acordo com TODO O MUNDO, e assim fazer esses sanguessugas trabalharem!
Sabe nada de economia esse Alexandre Torres. O Brasil não sobreviverá. Eita profeta do holocausto. Xô!
Esse “estuda” economia no face-book.
E “istória” pelos livros do Villa.
Uma sumidade o rapaz!
Ah, se um dia ele cair de quatro…
Este é dicipulo do Tucano, entreguista.
E segundo Vossa Imbecilência, se não temos uma economia de mercado aqui, temos o quê? Se fores responder que é um capitalismo de estado, saiba , que mesmo assim, é uma economia de mercado.
Alexandre, já pensei igual a você. Com o tempo comecei a perceber que algumas coisas não eram como apareciam na imprensa.
Te sugiro acessar o seguinte link: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/contasnacionais/2009/sicona2005_2009.pdf
É a publicação do Sistema de Contas Nacionais 2005-2009 (é a última publicação disponível porque neste ano de 2014 será divulgada a nova referência 2010). Procure a tabela 19, página 104, carga tributária e receitas disponíveis, por esfera de governo – 2005 – 2009.
Esta tabela mostra que a carga tributária total (impostos + contribuições+taxas) foi, em 2009, de 33,7% do PIB. Bem menos do que os seus “40% de impostos”. Mas, continue olhando a tabela e veja que se você descontar os subsídios, os benefícios e as transferências às instituições sem fins de lucro a serviço das famílias, o que resta para as três esferas de governo (federal, estadual e municipal) representou 18,5% do PIB (carga tributária líquida).
Aproveita, o olha a página 36, da mesma publicação. A administração pública produziu 16,3% do PIB, ou seja, os seus “40% de impostos” já se tornaram míseros 2,2%, que é a diferença entre o que os governos recebem e o que eles produzem ( e se fosse valorar as consultas médicas do SUS e as aulas das escolas públicas pelo valor do mesmo serviço privado, é bem provável que o governo esteja “pagando para trabalhar”).
Também de uma olhada numa outra tabela, a da página 28. Ela mostra que os impostos sobre produtos e serviços líquidos de subsídios correspondem a menos da metade do excedente bruto, ou seja, sobra muito dinheiro para a elite, e o leão não passa de um gatinho.
Cleo, você acredita mesmo que ele tenha algum interesse em aprender alguma coisa por si mesmo?
Que nada! É mais fácil assistir o Jornal Nacional e ouvir a CBN.
Aprender demanda esforço e inteligência. Melhor pra ele é o JN mesmo.
Pra quem é, bacalhau basta.
[]’s
Eu já fui assim, igual a ele. Já assisti muito jornal nacional. Chega um momento em que você começa a questionar qual a relevância daquilo que é apresentado ali. Porque algo errado deveria ser mostrado e algo que está certo não? Porque mostrar o Neymar treinando é mais importante do que mostrar um professor de educação física que dá aulas voluntárias em lugares pobres? Porque mostrar dicas de ceias de final de ano é mais importante do que mostrar o trabalho da Embrapa no combate a fome?
Porque a Globo chama de Marquês de Sapucaí a Passarela do Samba Porfessor Darcy Ribeiro?
Nesse momento é preciso ter humildade para aceitar o fato de que foi enganado.
Parabéns, Cleo, principalmente por dar tudo esmiuçado, porque certamente esse analfabeto funcional não entenderia nada das tabelas. Será que você conseguirá recuperar um vira-latas?
Grande Cleo, obrigado pela dica. Já baixei o relatório em pdf e vou estudar. Para isto vale a blogosfera “suja”, distribuir informação, cultura, politização e PRINCIPALMENTE, ampliar o amor por nosso Brasil, para que as próximas gerações cresçam e vivam numa Nação cada vez mais SOBERANA !
PS. Não percamos tempo com “gansos globais”! A ração que os nutre é o Jornal Nacional, e ela vem com as toxinas viciantes que os torna dependentes químicos…nada a fazer!
Bons estudos. Tenha certeza que você vai entender muito melhor a estrutura econômica e social do país. Outras sugestões que faço é ler as publicações do IPCA-INPC. Você não acha incrível o poder de síntese da imprensa, que consegue resumir centenas de páginas de publicações em 10 linhas de jornal?
Para complementar: aquela diferença de 2,2% entre o que os governos recebem e o que eles gastam é o que se chama de “superávit primário” e é usado para pagar juros da dívida pública.
Parabéns e obrigado Cleo.
Enquanto os incomPTentes ficam de quatro para a mídia os blogs nos ajudam a entender e ajudar o país e o seu povo.
Viva para os blogs “sujos” e progressistas, e para os seus comentaristas esclarecidos!
Para os cidadãos que cumprem as leis do país, pagam seus impostos regularmente, procuram respeitar os outros cidadãos, não compactuam com a corrupção, acreditam na meritocracia, no trabalho árduo e honesto, no estudo como meio mais adequado de crescimento pessoal e profissional, ler a entrevista com o senador Demóstenes Torres é um bálsamo, uma massagem revigorante na esperança no futuro desse país, um sopro de vida nos valores mais caros aos seres humanos, como a dignidade, a coragem, o respeito aos outros e á coisa pública.
Túlio Cesar Reis Gomes – Curitiba-PR
Revista VEJA – 15/06/2011 – pagina 44 – “Leitor”
Nada como olhar o passado com os olhos do futuro.
dentre “outras falcatruas” pode-se listar Privataria, Trensalão, Furnas, Propinoduto dos tucanos no ISS, Rouboanel do Paulo Preto (deixado na estrada?), helipóptero dos politicos mineiros, promotor que esquece o processo na gaveta errada … Engraçado, neles não consta ninguém que seja, de longe, petista ou de esquerda, ne? E o produto desses desvios rende juros para esses políticos viverem à farta em Paris e adjacências, sem trabalhar. Esse discurso beneficia a eles, e não a ingênuos que os defendem sem saber que recebem gordas comissões.
Completando a intervenção anterior vale dizer que acho lamentável o desvio do assunto de que trata o magistral artigo de Santayanna, que mereceria melhores comentários. Até peço desculpas por ter alimentado essa bobagem.
Todos mundo que conheço que vem da europa, diz que lá se paga muito mais taxa e imposto, do que no Brasil. Minha irmã que vive na Suiça, paga uma taxa anual pela quatidade de televisão que tem em casa. Suiça, Suecia, Italia, Noruega, Inglaterra são otimos lugares de se morrar ou de se criar filhos e netos, mesmo com os altos impostos cobrados lá. Ao contrario do México ou da India, Onde a qualidade de vida são pessimas, e se paga pouco imposto.
Fernando, o que eu não entendo é como o Presidente do Peru, Ollanta Humala muito ligado à Lula foi entrar nessa..esperemos a Michele Bachelet tomar posse para ver como fica..
Botava fé no Humala, mas acho que ele já pegou a coisa andando e deve estar remando contra a maré, o que não é fácil, se a maré chama-se EUA e tem apoio das classes mais ricas do Peru.
O mesmo deve estar acontecendo com a Bachelet.
Muito interessante e oportuno esse artigo do Santayana. É preciso maior divulgação dos temas realmente importantes e necessários para a conscientização das pessoas, pois estamos à mercê dos noticiários que abordam exaustivamente apenas a violência, os assaltos, os homicídios.
O povo precisa valorizar o que é nosso e deixar o complexo de vira-latas, pois temos muito de que nos orgulhar.
Artigo espetacular do Santayanna! Meus aplausos!
Não basta esclarecer, tem que humilhar estes capachos.
Falou Tudo, Sensacional!