Cristina Serra: O ‘cara da casa de vidro’

Cristina Serra, na Folha de hoje, cobra “prioridade absoluta de investigadores, imprensa, autoridades e instituições” sobre o que aconteceu com as investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro que interceptaram conversas de comparsas do miliciano Adriano da Nóbrega, chefe de um grupo paramilitar de extorsão e peça importante, pelas homenagens que recebeu do clã presidencial e pelos empregos fantasma que seus parentes muito próximos receberam no gabinete do hoje senador Flávio Bolsonaro.

As revelações do The Intercept, embora não permitam conclusões, são graves demais para que se percam no “e daí?” que vem caracterizando as famosas “rachadinhas” que, em qualquer parte do mundo, seriam hoje um terremoto permanente sobre a República.

Mas a coragem da articulista não parece ser atitude comum em quem tem a obrigação de buscar a verdade, ainda que vergonhosa.

É tão nítido, tão visível o que acontece hoje neste país que a charge do Laerte, também na Folha, dispensa qualquer explicação.

O cara da casa de vidro

Cristina Serra, na Folha

O repórter Sérgio Ramalho, do site The Intercept, teve acesso a um relatório do Ministério Público do Rio de Janeiro com o resumo dos grampos telefônicos de comparsas de Adriano da Nóbrega. Como se sabe, Adriano era o chefe da milícia Escritório do Crime e foi morto em uma operação policial, na Bahia, que mais parece queima de arquivo. As conversas indicam conexões muito mais profundas entre o ex-policial militar e Bolsonaro do que se sabia até então.

Após a morte de Adriano, seus cúmplices teriam procurado um homem, mencionado nos grampos como o “cara da casa de vidro”. Fontes do MP-RJ ouvidas pelo site dizem tratar-se de Bolsonaro, e a “casa de vidro” seria uma referência à fachada envidraçada do Palácio da Alvorada. O homem também aparece no relatório como “Jair” e “HNI (PRESIDENTE)”. HNI é a sigla para Homem Não Identificado.

As conversas começaram na data da morte de Adriano e foram interrompidas dias depois, quando surgiram as supostas menções a Bolsonaro. O Ministério Público estadual não tem poder para investigar o presidente, e um caso como esse teria que ser encaminhado à Procuradoria-Geral da República.

Esclarecer essas conexões deveria ser prioridade absoluta de investigadores, imprensa, autoridades e instituições no Brasil. Porém, as investigações que envolvem o sobrenome Bolsonaro parecem contaminadas pela lentidão e por generosa condescendência em instâncias do aparelho estatal. Não por acaso, Bolsonaro sente-se à vontade para debochar dos 400 mil mortos pela pandemia usando a expressão “CPF cancelado”, a gíria miliciana para pessoas assassinadas.

Facebook
Twitter
WhatsApp
Email

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *