Mino e os dois pesos da Justiça: “Carlos Cachoeira vive à larga”

mino

 

Dizer que o texto de Mino Carta ,na CartaCapital, é sereno como convém  ao magistral é desnecessário.

Mas impressiona a tristeza do olhar de um velho jornalista, que conheceu por dentro todo a a história da mídia brasileira nos últimos 50 anos, sobre nossa Justiça e nossa intelectualidade.

Toca-me, sobretudo, a menção que faz às grades, acessório odioso que um dia supusemos estar em extinção, que em todos os sentidos – o da propriedade, o do cárcere, o do espaço urbano – sempre ” a segregação de alguns, para segregar a maioria e assegurar a incomunicabilidade entre uns e outros.

No subúrbio do Lins de Vasconcellos, no raiar dos anos 70, um pequeno conjunto de prédios de classe média na Rua Cabuçu, modesto, serviu-se da primeira afluência dos tempos de milagre para construir muros entre os prédios, talvez para não se confundir com os “BNH”. E os jovens, como meu amigo Luís Carlos e seus irmãos, logo o picharam: “ficaram ricos? pra que muro? não somos vacas”.

Morreu ontem um homem que suportou 27 anos de grades e viveu e os 95 de sua vida dedicado a derrubar muros.

Talvez seja esse o preço de não sermos e não querermos ser, como os meninos da Rua Cabuçu não queriam, simples vacas.

O primado da incompetência

Mino Carta

Regresso ao país depois de duas semanas de ausência nesta página, passadas em cidades onde é possível dispensar o carro, porque o transporte público funciona à perfeição. Figuram no mapa de países atingidos gravemente pela crise global e ainda assim firmes nas práticas do Estado de Bem-Estar Social. Falo daquele que apelidamos de Velho Mundo, cuja propalada velhice teima em nos oferecer bons exemplos.

Chego, e me alcançam notícias díspares, entre a renúncia do injustiçado José Genoino e a possibilidade de ver fechado com grades o espaço livre criado debaixo do Masp pela arrojada estrutura saída, mais de 45 anos atrás, da prancheta de Lina Bo Bardi. Não era este o propósito da arquiteta, muito pelo contrário. Ela imaginava que aquela área valeria como um terraço a mirar o centro de São Paulo.

A cidade contava com pouco mais de 3 milhões de habitantes, incapaz de antever o futuro desvairado da megalópole, aflita hoje pela miséria de tantos, invadida nas noites sujas da Avenida Paulista por chusmas de mendigos, assaltantes, fumadores de crack, traficantes, prostitutas emidnight cowboys. São Paulo não poderia supor o descalabro, a irresponsabilidade, a incompetência de governos tragicamente desinteressados do destino dos habitantes dos rincões pobres do Brasil, governos tolhidos para políticas voltadas a manter as populações no lugar de origem. É o que explica também a multiplicação das grades, a segregação de alguns para segregar a maioria e assegurar a incomunicabilidade entre uns e outros.

Enquanto isso dou com a mídia nativa ainda em regozijo com as prisões dos chamados “mensaleiros”. Proclama-se o primado da justiça como prova de progresso democrático, em proveito de uma pós-modernidade retumbante. Ouvi até, em conversas de bar, comparações entre as condenações impostas pelo Supremo Tribunal Federal e o triste fim de Silvio Berlusconi, expulso do Senado italiano depois da condenação definitiva pela mais alta Corte peninsular.

A súbita louvação do nosso Judiciário serve para encobrir a verdade factual, a começar pelo emprego de pesos e medidas opostos no julgamento dos mais diversos gêneros de corrupção política. Até o mundo mineral sabe desta singular situação, pela qual a casa-grande goza da leniência da Justiça, em todos os níveis de atividade.

Se vale o exemplo da Itália, basta lembrar as prisões de Calisto Tanzi e de Sergio Cragnotti, bons conhecidos nossos, ou a condenação do primeiro-ministro Bettino Craxi, pronto a fugir para a Tunísia para evitar oito anos de cárcere. Aqui rico não vai para a cadeia. Cachoeira, aquele que instalou para a Veja todo um sistema de monitoração dos movimentos de José Dirceu, vive à larga. A revista, nem se fale. A Operação Satiagraha foi enterrada a bem de Daniel Dantas, o banqueiro condenado mundo afora e providencialmente (e inexplicavelmente?) poupado aqui na terrinha.

Na Itália, sublinho, José Genoino seria um herói celebrado por ter lutado contra a ditadura civil-militar, assim como o foram os partigiani da Resistenza nos derradeiros anos da ditadura fascista. Combate extremo em condições clamorosamente desfavoráveis, lá como no Brasil. Os italianos enfrentavam, antes que os últimos fiéis de Mussolini, o próprio exército nazista. No Araguaia, 10 mil soldados foram deslocados para se haver com 80 guerrilheiros, Genoino entre eles.

Nunca esquecerei como se deu a descoberta da resistência do Araguaia. Dirigia então a redação de Veja quando chegou, via telex, estranha máquina que um jovem de hoje definiria como de uso desconhecido, o aviso censorial: proibida qualquer referência à guerrilha. Que guerrilha? Nada sabíamos a respeito, colhidos de surpresa nos entreolhamos perplexos. Em primeiro lugar diante da fulgurante incompetência da inteligência fardada.

Há alguma, vaga semelhança, entre o Araguaia e Canudos, sem a pretensão de comparar Genoino com o Conselheiro. O qual contava, além do mais, com Euclides da Cunha, disposto a rever suas próprias posições e a se contrapor ao pensamento da casa-grande.

Os Sertões é obra-prima do jornalista-escritor de uma época literariamente rica, sobraram para o dia de hoje a mediocridade, a má-fé, a incompetência da mídia nativa. Pois é, a incompetência dá sempre o ar da sua graça.

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12 respostas

  1. Ignorante politico é o povo que não percebe a inconsistência de uma denúncia. como pode uma pessoa que arriscou a própria vida pela liberdade de sua pátria ser tão rapidamente julgado culpado de um crime e sem provas? Por isso o Lula, por é dado como um herói, semelhante à Mandela (só teremos certeza quando ele morrer…) e aqui é tão menosprezado pela mídia dominante, convence parte da população, que age como filhos ingratos, pois foram beneficiados pelas ações do PT e do Lula.

  2. Ignorante politico é o povo que não percebe a inconsistência de uma denúncia. como pode uma pessoa que arriscou a própria vida pela liberdade de sua pátria ser tão rapidamente julgado culpado de um crime e sem provas? Por isso o Lula, por é dado como um herói, semelhante à Mandela (só teremos certeza quando ele morrer…) e aqui é tão menosprezado pela mídia dominante, convence parte da população, que age como filhos ingratos, pois foram beneficiados pelas ações do PT e do Lula.

  3. Ignorante politico é o povo que não percebe a inconsistência de uma denúncia. como pode uma pessoa que arriscou a própria vida pela liberdade de sua pátria ser tão rapidamente julgado culpado de um crime e sem provas? Por isso o Lula, por é dado como um herói, semelhante à Mandela (só teremos certeza quando ele morrer…) e aqui é tão menosprezado pela mídia dominante, convence parte da população, que age como filhos ingratos, pois foram beneficiados pelas ações do PT e do Lula.

  4. “…sobraram para o dia de hoje a mediocridade, a má-fé, a incompetência da mídia nativa. Pois é, a incompetência dá sempre o ar da sua graça.” Não há melhor tradução para os dias de hoje, melancolicamente concordo com Mino.

  5. Sou advogado com 43 anos de atividade. Tenho aqui meus 70 anos. Estou envergonhado da imprensa e do Judiciário de meu País. Hoje, infelizmente, o Poder Judiciário passou a ter poderes que ultrapassam o bom senso democrático. Suas decisões, mesmo contrárias aos textos constitucionais, são tidas e festejada pela mídia indecente, como grandes feitos contra a corrupção, enquanto isto o mensalão tucano dorme em berço esplêndido, no aguardo das prescrições, que já começaram. A liberdade m nosso país está sendo substituída pelo arbítrio do Judiciário, com aplausos da mídia conservadora, para a tristeza daqueles que acreditaram que um dia o sonho de Taiguara iria se realizar.

  6. Sempre que vejo a figura do Joaquim Barbosa lembro-me de Roberto Jefferson, imagem que reflete os instintos mais selvagens dividida entre Baby Doc e Idi Amin Dada. Não tenho a menor dúvida, em seu reino as mulheres serão tratadas com a mesma delicadeza que ele tratava a ex-mulher, onde porradas eram carícias.

  7. Parece-me, que não estava vendendo terrenos no céu.
    Estava pronto para a luta por eles..
    E queria que muitos fossem junto.

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