STF autoriza a “xepa” das delações, via Polícia

deladuke

A absolvição da Senadora Gleisi Hoffmann, por falta de provas das acusações de corrupção e de lavagem de dinheiro baseadas em delações regiamente premiadas, pôde dar alguma esperança de que o Supremo Tribunal Federal estivesse colocando limites na deformação de processos judiciais baseados essencialmente no “dedurismo” de gente que, para fugir de suas responsabilidades ou por simples medo, acaba incriminando aqueles que a máquina repressiva deseja destruir, seja pela denúncia, seja julgamentos que, por si só, são verdadeiras aberrações.

Mas vê-se que essa esperança é fugaz.

Hoje, o STF legitimou uma nova aberração, porém, ao permitir que acordos de delação premiada sejam propostos diretamente ao juiz pela Polícia (Federal e estaduais), sem a participação do Ministério Público.

O fato de promotores estarem usando abusiva e deformadamente o instituto de delação não quer dizer que estender esta franquia à polícia, que dispõe até de mais meios de coação que o MP, possa entrar nesta verdadeira “farra de delações” que se vive hoje na Justiça Criminal e que se tornou, ao contrário do que pode parecer aos incautos, uma forma de transformar o processo judicial não numa ferramenta de apuração da verdade, mas num instrumento de transações (e não só penais) e de perseguições políticas.

E não se diga que a homologação de um juiz vai proteger o processo deste tipo de deformação, porque mesmo que seja um magistrado de boa-fé – o que anda raro – os simples depoimentos e uma montanha de papéis não vão permitir que, sem ouvir as partes, possa avaliar se o que se tem não é, basicamente, uma acusação que visa a livrar o acusador das consequência de seus crimes e que o dirigismo policial juntou apenas aquilo que pode ajudar a “confirmar” o que se disse.

Pior ainda: estabelece-se uma “competição” de deduragem entre policiais e promotores, em lugar da colaboração que deveria existir para apurar a verdade.

Além de isso ser absurdo – colocar duas instituições numa disputa – ainda abre espaço para que delatores e advogados abram um verdadeiro leilão entre elas, trocando propostas de penas menores ou de perdão por acusações que sejam mais “rentáveis” para promotores e delegados.

E o prejuízo vai além. Como no Brasil os juízos de instrução e o de julgamento não se distinguem, são o mesmo, a aceitação da delação e de seu acordo, previamente, pelo julgador do delatado significa, mais que a aceitação da denúncia a ser processada, um juízo de valor sobre o que diz o delator, que é tomado como verdade sem que, muitas vezes, o acusado sequer possa saber o que disse.

Ao contrário das técnicas de investigação técnicas, que deveriam ser o traço de uma Justiça moderna, estamos andando para trás, para o tempo onde se “pendurava” um acusado para ele delatar gregos e troianos e deixar que se “escolha” quem interessa.

Agora, quando o MP achar que não vale a pena alguma “deduragem” e deixar o acusado diante de seu processo, sempre será possível oferecer a delação na “xepa” policial.

Pode até haver algo de bom, mas o que impera nessa xepa é lixo, apenas.

Mas é um passo a mais para o estabelecimento do Estado Policial, patrocinado pelo Judiciário.

 

 

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14 respostas

  1. Não digo que o uso da delação pela Polícia Civil seja tão maléfico. Talvez evite o uso do pau de arara em alguns casos. Nossa polícia tem dificuldade em investigar (vide caso Mariele).
    Alíás, a prática vem desde a inquisição. Inquirir, inquérito. A polícia só sabe perguntar, por bem ou por mal. No mais é porrada. Até que confesse ou delate. Com a delação premiada talvez diminua a tortura em delegacias.
    Já a PF com seu viés político de coxinhas concurseiros que acham que para ser presidente da república deve-se ler algumas apostilas e fazer uma prova em vez de participar de uma eleição, continuarão usando a delação com viés político. Só que não são tão inteligentes quanto se acham e vão deixar muita merda no caminho;

    1. MP – acusador.
      PF – investiga.
      Judiciário – julga.
      Pelo menos deveria ser assim. Mas, nesses últimos tempos, o MP estava fazendo papel de polícia e de juíz, além das acusações.
      Nesse sentido, penso que pode ter sido mais uma derrota ao lavajatismo, o que pode ser bom.
      Me corrijam se eu estiver me iludindo.

  2. Imagina uma ferramenta dessas nas mãos daquele delegado que ataca, cotidianamente o acampamento LULALIVRE

    1. Por essas e outras que sempre brinco que – caso Boçal Nato vença e libere a venda de armas – vou comprar logo umas três, pois sei que vou derreter o cano de duas de tanto usá-las.

      A lista cresce a cada dia.

  3. Um “judiciário” medieval no pior que existe na palavra. “É com o Supremo e TUDO…”, dizia o prolixo senador…O supremo se apequena mais uma vez. O mal, senhores, SEMPRE retorna com intensidade maior a quem o fez. Está chegando a hora de uma Constituinte…

  4. Mais uma decisão sem análise. Não devem ter consultado ninguém. É o famoso “eu acho”. Só mudam para pior.

  5. É sempre bom lembrar: no governo democrático e popular do PT, houve mais recursos humanos, tecnológicos e orçamentários do que nunca para a PF, CGU (não era nada) e iniciativas de elaboração do instituto da delação premiada e da criminalização do corruptor no Código Penal (não havia antes), cortando na própria carne. Poderia não ter investido nem um pouco contra a corrupção e tido uma aparente menor corrupção. Que agora, enfim, haja condenações de corrupção erga omnes, inclusive a entes do judiciário e do Ministério Público, pois ninguém está isento de cometer erros.

  6. “E não se diga que a homologação de um juiz vai proteger o processo deste tipo de deformação”: bom puxar o exemplo recente da juíza que autorizou a operação para prender o reitor da UFSC.

  7. PODER EM EXCESSO

    Uma procuradoria séria não daria andamento a denúncias sem o devido colhimento de provas na fase investigatória, o que caberia à polícia federal. Depois, entendendo que há elementos sólidos, deveria haver a persecução penal propriamente dita. Mas, no Brasil, nesses últimos tempos, o MP tentou monopolizar o poder de polícia, sem competência pra isso e, ainda, se meteu a julgar antecipadamente os casos, fazendo às vezes do juiz. Ou seja, quis ter poder de polícia, predecessor do seu papel de acusador; e de julgador, sucessor à acusação. Em suma, pretendeu ser mais do que o tal 4º poder. Pensou ser imperador do Brasil e meteu os pés pelas mãos. Com a bênção de alguns juizecos irresponsáveis. Por essas e outras, quando um juiz mais sério resolve peitar a PGR, o MP sobe nas tamancas (mal acostumado que está) e se mete a avaliar o julgamento exclusivo do poder judiciário, ferindo o equilíbrio entre poderes. Isso que dá “mimar” um deles. Depois fica difícil pra retirar o “brinquedo” da mão da criança.

  8. eh.
    E o nosso Legislativo vai ficar inerme de hoje em diante, vendo tudo isso?
    Por acaso ha algum P/L em tramitaçao que tenha começado APÓS as transações, troca-trocas, descarados mercadejamentos e abertas negociatas JUDICIARIO/BANDIDAGEM nos ultimos tres anos?

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