Um necessário julgamento moral

Ao escrever, por vezes, acha-se que se foi longe demais nos adjetivos, movido pela indignação com o que acontece em nosso país.

Quando o que se diz, porém, é dito por outros, de ideologia diversa, a gente se realimenta deste nojo pelo que se passa nestes tempos indizíveis.

Luiz Fernando de Carvalho Pinto, advogado, editorialista da Folha, um homem de pensamento liberal, escreve hoje na Folha, de forma mais explícita, o que se disse aqui sobre o fato de colaborar com o governo Bolsonaro ser imperdoável.

Diagnóstico que vale, como se disse ontem – e não pela primeira vez – aqui sobre o ministro Marcelo Queiroga.

É texto sólido, mas cheio de enjoo cívico sobre quem entrega a alma a um projeto demoníaco, de morte e de dor para os brasileiros.

Não há mocinho no governo Bolsonaro, só bandidos

Luís Francisco Carvalho Filho, na Folha

Afastada a possibilidade de impeachment (apesar do rosário de crimes cometidos e do colapso econômico e sanitário, falta vontade política no Parlamento), o Brasil terá que conviver com um governo de terroristas e delinquentes, cada vez mais aloprados pelo fantasma da impopularidade.

Todos que ocupam cargos de confiança no governo federal são cúmplices de Jair Bolsonaro e fazem parte de uma quadrilha política que conspira contra a democracia.

Não há mocinho no governo Bolsonaro. Só há bandidos. Não há espírito público. Só há espírito de golpe —além de muita picaretagem, é claro.

A imagem do miliciano Fabrício Queiroz, corrupto de estimação da família Bolsonaro, sendo tratado como celebridade fascista em Copacabana, em manifestação convocada para erodir a credibilidade do Supremo Tribunal Federal, sintetiza o estado das coisas. O escárnio não tem limites.

O recuo de Jair Bolsonaro é estratégico e tem por objetivo principal obter aliados para a paralisação das investigações instauradas para apurar o enriquecimento ilícito de seus filhos. A corda esticada demais com o STF deixou de ser conveniente.

Bolsonaro conta com a pusilanimidade de personagens de outros poderes, inclusive no Judiciário, sempre aflitos para (metaforicamente) tirar selfies com o célebre Fabricio Queiroz, receber medalhas no Palácio do Planalto ou enxergar boa-fé nos desatinos presidenciais.

Agrado ao chefe do Executivo sempre fez parte do cardápio de serviços prestados pela PGR desde o fim do regime militar, mas nunca um procurador-geral da República foi tão descaradamente servil e rasteiro como Augusto Aras: definiu como “festa cívica” as manifestações contrárias ao STF.

O presidente da Câmara reagiu rápido à confusão provocada pelo presidente, mas deixou escapar depois sua posição de apoio a Bolsonaro na arbitragem do conflito: “ninguém é obrigado a cumprir decisão inconstitucional”.

Especialista em disfarces e tergiversações, o presidente do Senado primeiro sumiu. Ao reaparecer, não teve coragem de incluir em seu pronunciamento insosso uma crítica concreta aos ataques golpistas do presidente da República. Como não poderia deixar de ser, Rodrigo Pacheco festejaria a nota de “pacificação” do presidente beligerante e criminoso como um espetáculo da democracia brasileira: “Vai de encontro ao que a maioria espera”. Na verdade, senador, a maioria quer ver o impeachment de Bolsonaro.

A devolução da Medida Provisória das fake news pelo presidente do Senado, baseada em manifestação assinada pelo procurador-geral da República, é um arranjo entre amigos (de Bolsonaro). Como o Supremo iria rejeitá-la, Aras e Pacheco fingem que são independentes, o presidente da República pode posar mais uma vez de vítima de poderes ilegítimos, que não o deixam governar em paz, e, por não externar agressões ou grosserias, tenta transmitir a ideia de que, graças às mágicas mãos de Michel Temer, é um novo homem.

Mas Bolsonaro não muda.

A investida contra a vacinação de adolescentes pelo ministro golpista da Saúde é uma releitura politica dos ataques de Bolsonaro ao Supremo e à urna eletrônica.

Agrada bases obscurantistas, frustradas pela aparente covardia do recuo pós 7 de setembro, propaga mentiras institucionais, uma especialidade do atual governo, e corrói a reputação de adversários, governadores e prefeitos.

Marcelo Queiroga é pior e mais daninho que Eduardo Pazzuelo.

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