Veríssimo: os generais não podem se queixar

Outro dia, perguntei aqui se alguem duvidava do que Lula disse sobre sermos governados por um bando de malucos.

Hoje, n’O Globo, o craque Luis Fernando Veríssimo responde magistralmente a esta pergunta.

Não é assim. É pior.

Malucos e malucos no governo

Luis Fernando Veríssimo

O Lula disse que o Brasil está sendo governado por um bando de malucos. Exagero, claro. É difícil associar o que acontece no Brasil hoje com qualquer atividade que lembre o verbo “governar”. A mesma coisa com o termo “bando”, que, bem ou mal, evoca algum tipo de organização. Lula também exagerou ao chamar de “malucos” os que se aproveitam da confusão para promover seus projetos políticos pessoais, e que de loucos não têm nada. No mais, o Lula tem razão.

A alusão mais precisa que Lula, talvez, procurasse para nossa situação seria a do manicômio dominado pelos pacientes. Este sentimento de um país à deriva, sem entender seu governo e sem entender a si mesmo, é — imagina-se — quase total, mesmo entre os que bolsonaram e esperavam em vão que o “mito” começasse a atuar, nem que fosse só na escolha de um ministério menos exótico. Um bando de malucos se apossando da administração deixa o país tremebundo, mas institucionalmente de pé. Maluco se revoltando contra a instituição é outra coisa, mais grave. Não fica nem uma caneca de pé.

Os generais que ganharam uma nação de graça, sem necessidade de disfarçar farda com terno ou tanque com discurso, estão achando difícil a convivência com civis, chame-se Olavo ou não. Descobrem como eram melhores as revoluções clássicas, com tropas nas ruas. Mas os militares não podem se queixar muito. Se a eleição do Bolsonaro provou alguma coisa — e provou várias — é que boa parte de 60 milhões de eleitores do país não deu a menor bola para o passado e os crimes das Forças Armadas brasileiras nos 20 anos da ditadura que o candidato vencedor diz que nunca aconteceu.

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15 respostas

  1. a verdade é que esses 60 milões que elegeram o traste – e mais alguns – nem sabem que teve ditadura, nem sonham com o que aconteceu, o povão está na mais absoluta ignorância sobre essa página infeliz de nossa história

      1. eu tenhop 65 anos, e estudei em plena ditadura, e obviamente, na escola, nunca me foi dito nada – imagine que toda a minha geração está na mesma situação.

        sei tbm que, agora mais recentemente, muitos professores foram censurados quando resolveram falar sobre a Ditadura – os pais dos alunos se sentiram incomodados e não querem saber desse tema

    1. Não sejamos ingênuos, desses 60 milhões, pelo menos uns 15-20 milhões sabem muito bem que houve ditadura, sabem o que aconteceu na ditadura e defendem os crimes cometidos pela ditadura como necessários (para manter seus privilégios, para encobrir a própria participação – ou de gente próxima – nos desmandos e no arbítrio ou para dar vazão à sua insanidade fascista). Não houvesse este passivo fascista, especialmente no exército, na mídia corporativa, no setor financeiro, no rentismo e no judiciário, muitas coisas teriam sido passadas a limpo.

      1. olha, eu não tenho nenhum dado sobre isso

        mas pessoas na faixa dos 50 / 60 anos – estudaram em plena ditadura e, por óbvio, não estudaram isso na escola

        e nem o mais jovens tiveram isso na escola, e quem terve foi muito pouico, me lembro de ler vários relatos de professores dizendo que o tema ditadura era quase que proibido

        então, quem conhece teve que buscar por si mesmo, ou conhece alguém que foi vítima, falou alguma coisa e resolveu pesquisar – esse foi o meu caso – e vamos combinar, as pessoas, de modo geral, não são muito afeitas a fazer pesquisas

  2. Enfim, uma crítica a uma fala de Lula com a qual eu concordo, em gênero, número e grau.

  3. Alguém já disse que LFV é um gigolô das palavras. Ele escreve com muita lucidez. Resume uma ópera com poucas linhas. Não é por acaso que é filho do grande Érico Veríssimo. Gaúcho bagual!

  4. “magistral” foi um bom adjetivo! a síntese está sensacional, obrigada por compartilhar aqui! (clicando no original tem um parágrafo extra, _pseudo-off-topic_, singelo)

    edit: por algum motivo, apesar de ser restrito para assinantes, a página original abriu uma vez. só uma, agora já não mais. :/

  5. No final da segunda guerra e durante um bom tempo, houve uma tendência de classificar o Hitler como maluco, o que, de certa forma, o isentava da culpa pelo que provocou. A meu ver, Bolsonaro não tem nada disto e há sim um projeto que aos poucos vem se tornando claro, no sentido de uma tomada total do poder pela extrema direita. A análise atenta da briga com as FFAA, a performance do governador do Rio semana passada, a liberação de armas para milhões de pessoas, as milícias, que continuam intocadas (alguém lembra do Queiroz?) e muito mais apontam sim numa direção bem definida

  6. E muito pior que tudo que se verifica, é que além de os malucos estarem se auto-administrando,são os 60 milhões de eleitores,que além de votarem nesse tipo de gente,também continuam indiferentes,ou até torcendo,por nova DITADURA VERDE OLIVA.

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